O deputado Henrique Alves (PMDB-RN) já procurou os técnicos do governo para discutir como derrubar os artigos 49 e 50 do principal projeto de lei do novo marco regulatório do pré-sal. O parlamentar deve ser o relator do projeto que introduz o sistema de partilha de produção e, mesmo sem ter sido indicado oficialmente para a relatoria, já começou a discutir como substituir o que o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, arrancou de Lula no jantar de domingo, no Palácio da Alvorada.
Estavam presentes no jantar que precedeu a divulgação do novo marco regulatório do pré-sal, na segunda feira, também os governadores de São Paulo, José Serra, do Espírito Santo, Paulo Hartung. Preparado para travar uma guerra, Cabral foi acompanhado por dois secretário: o de Desenvolvimento, Júlio Bueno, e da Fazenda, Joaquim Levy, ex-secretário do Tesouro Nacional e velho conhecido da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do presidente Lula.
A prefeita de Campos, Rosinha Garotinho, também procurou assessores do Ministério da Fazenda e das Minas e Energia, na quarta feira, para apresentar uma contraproposta ao texto do referido artigo que pode ser o ponto de partida para uma negociação no Congresso.
O assunto envolve muito dinheiro e é complexo. Os dois artigos dizem que enquanto não houver uma lei específica mudando os royalties e a participação especial que vigora nas concessões, permanece tudo como está. Com esse dispositivo o Rio conseguiu garantir que os Estados produtores, os municípios confrontantes e os municípios com instalações necessárias à exploração do petróleo do pré-sal recebam, no regime de partilha de produção, o que receberiam se nessa área continuasse a vigorar o sistema de concessões.
O projeto de lei original do Executivo remetia essa receita integralmente para o Fundo Soberano. O governo do Rio, na verdade, chegou ao encontro com Lula pedindo mais. A proposta, exposta por Levy, era de que coubesse aos Estados e municípios 50% do que a União apurar nas licitações. Lula quase cedeu.
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, presente ao jantar de domingo, fez a sugestão que prevaleceu, acalmando a tensão do governo do Rio. Os campos do pré-sal estão no mar territorial do Rio, São Paulo e Espírito Santo (a 300 quilômetros da costa). Desses, o Rio é o que concentra a maior área da "picanha azul", que é como o governo está chamando toda essa extensão, cujo formato é de uma suculenta picanha.
Enquanto prevalecer o artigo 49, os Estados poderão ficar com 11,2% do que a União receber. Cálculo que pressupõe que, em cada bloco de exploração, 10% sejam distribuídos em royalties, 20% representem os custos da empresa contratada e 70% corresponda ao excedente de produção ("profit oil"). A cada licitação será definido que percentual dos 70% será destinado ao governo federal e que parte ficará com a empresa contratada.
A sugestão de Rosinha Garotinho é de se fazer um regime misto. Do que couber à União nas licitações, 40% seria distribuído com base nos critérios da lei 9.748, que rege as concessões, e 60% seria integralmente da União. O que se fez para resolver o impasse criado pelo governador do Rio foi aplicar ao regime de partilha os mesmos cálculos usados nas concessões.
Levy se baseou no artigo 20 da Constituição, que assegura aos Estados e municípios produtores participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural "ou compensação financeira por essa exploração". A compensação financeira pode ser feita mediante pagamento de royalties, por exemplo.
A reunião no Alvorada foi longa. Por volta de 1 hora da manhã de segunda-feira Jobim ainda estava em uma sala do palácio com Levy, Bueno, os secretários de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, de Petróleo e Gás do Ministério das Minas e Energia, Marco Antônio Martins Almeida, e José Lima de Andrade Neves, presidente da BR Distribuidora. Lá, acrescentaram os dois artigos, apaziguando Cabral. Segundo relato de presentes, Serra e Hartung pouco se manifestaram sobre esse aspecto da lei.
Dilma e o ministro Edison Lobão, também reunidos no jantar, não gostaram do arranjo de última hora de Levy e Jobim.
Depois dessa vitória, para Cabral o jogo recomeça do zero. Acredita-se, no governo, que o Rio será "trucidado" no Congresso (segundo um qualificado assessor de Lula) pelas bancadas dos outros 26 governadores que também querem uma parte do dinheiro do pré-sal, por entenderem que a riqueza é do país e não apenas dos três Estados.
Será uma batalha convencer o Congresso que, numa produção de R$ 100,00 num poço do pré-sal, supondo que a União receba 80% do excedente, a aplicação dos artigos 49 e 50 resultará numa distribuição em que caberá aos 24 Estados fora do pré-sal e aos milhares de municípios, R$ 0,875 (a título de royalties). A União ficará com 45% e o restante, afora os custos, será distribuído entre os Estados produtores do pré-sal (quase 27%0 e os seus respectivos municípios (5,5%).
Claudia Safatle é diretora adjunta de Redação e escreve às sextas-feiras |
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