Os políticos entenderam que a gordura fiscal a ser tirada na Comissão Especial pode vir a ser capitalizada, tornando a reforma “mais justa”
Há um amplo espectro de negociação política, que tem como um dos protagonistas o governador de São Paulo João Dória, na nomeação do deputado do PSDB de São Paulo Samuel Moreira para presidir a Comissão Especial da reforma da Previdência. E o mais interessante é que esse jogo tem como premissa que o sucesso da reforma dará aos partidos que se posicionarem favoravelmente desde o início vantagens eleitorais em 2020, já nas eleições municipais. Uma luz dos holofotes políticos num tema polêmico, mas que parece inevitável.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, sempre trabalhou com a hipótese de que o relator da Comissão teria que ter sinergia com o ministro da Economia Paulo Guedes mas, principalmente, com Rogério Marinho, Secretário Nacional de Previdência, que é do PSDB. Por isso, os nomes mais cotados eram daquele partido, que logo no inicio das negociações avisou que queria o cargo.
O DEM, partido de Rodrigo Maia, corria por fora, tendo como postulantes ao cargo os deputados Pedro Paulo e Artur Maia. Um cargo que pode vir a ser tóxico para quem vive de votos, estava sendo disputado por partidos que têm um eleitorado de classes média e alta perdido para o fenômeno Jair Bolsonaro na eleição presidencial.
Maia achou que o poder ficaria muito concentrado no DEM, e optou pelo tucanos. Mas é claro que Dória sempre teve interesse em que o PSDB de São Paulo entrasse no processo e, nas últimas 48 horas trabalhou fortemente para isso, por diversos motivos, o principal deles a convicção de que, ao contrário do senso comum, existe capital político na reforma, e em assumir posição clara na vida pública.
Assim como o presidente da Câmara acha que defender a reforma trará benefícios de médio e longo prazos para os deputados, melhorando suas imagens diante do cidadão, também Dória já defendia pessoalmente essa visão, e também deseja essa marca para o PSDB, como um primeiro reencontro com o eleitor tucano sob seu comando, ou refundação do partido, como gosta de definir a atual situação, depois que tomou conta da legenda ao se tornar o político mais vitorioso do PSDB nas últimas eleições.
Tendo o valor do corte sido reajustado para R$ 1,3 trilhão, acima da marca de R$ 1 trilhão inicialmente anunciado, os políticos entenderam que a gordura fiscal a ser tirada na Comissão Especial pode vir a ser capitalizada, tornando a reforma “mais justa”.
Foi pensando nisso que João Dória entendeu que o PSDB na relatoria do projeto na Comissão Especial poderia ser beneficiado por uma ação claramente voltada para a defesa dos mais pobres. Pelas contas apresentadas oficialmente, os deputados consideram que são quase meio trilhão de gordura entre o novo cálculo e o “piso Bolsonaro”, de R$ 800 bilhões.
Para se ter uma idéia, tirar integralmente da reforma a aposentadoria rural e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), no pressuposto de que prejudicam os mais necessitados, gerará um corte de R$ 127 bilhões, e ainda restariam mais cerca de R$ 300 bilhões que poderiam ser negociados, “bondades” que iriam para a conta dos partidos que tiverem protagonismo na Comissão Especial, como a relatoria do PSDB.
Há outra ação que será atribuição do relator: garantir a permanência dos ajustes previdenciários para os Estados. Além de Dória não ter o desgaste de ter que aprovar o plano na Assembléia Legislativa de São Paulo, o auxílio fiscal tornaria ainda mais vistoso seu governo para 2022, quando se prepara para concorrer à presidência da República.
Ele também tentará ser o fiador da negociação do relator de pontos da reforma diretamente com o presidente Bolsonaro, o ministro da Economia Paulo Guedes e a equipe econômica. Em troca, vantagens, em primeiro lugar para São Paulo, em seguida para Governadores do PSDB e, consequentemente, para os demais governadores, consolidando uma liderança que ser o governador do maior Estado da Federação naturalmente lhe dá.
A escolha do deputado Marcelo Ramos, do Centrão, para presidir a Comissão Especial, como representante de um grupo influente na Câmara, dará também respaldo a uma condução dos trabalhos que ajude a sua aprovação. A Presidência da Comissão tem o “poder do tempo”, na medida que pode acelerar ou frear o cronograma dos trabalhos.
No primeiro momento, o Centrão mostra-se insatisfeito com essa divisão. Rodrigo Maia, no entanto, está otimista com a possibilidade de aprovar uma reforma que não seja “aguada”, e João Dória sabe que o aprofundamento dos laços com o presidente da Câmara é fundamental para a campanha de 2022, um possível competidor, ou parceiro, ocupando a mesma faixa de eleitorado.
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