CORREIO BRAZILIENSE - 08/03
Antes do julgamento do mensalão, os criminalistas com quem conversei diziam que o processo estava eivado de nulidades e pontificavam com o rigor dos tipos penais. Assim, a lavagem de dinheiro estruturalmente exigia mais isso e aquilo, que não estavam nos autos. E assim, por diante. Na ocasião, não apenas lhes disse, como escrevi neste espaço, que as coisas se passariam de modo diverso, como de fato se passaram.
Agora, não tão convictos, fazem outras apostas, a começar pela delação da delação, ela teria o viés de livrar a cara do delator às custas de falsas incriminações dos clientes, de tudo inocentes. Não é bem assim. O relato do delator deve, necessariamente, indicar fatos comprovados ou a comprovar, sob pena de nada lhe valer a delação ou seja a diminuição superlativa das penas as quais estaria sujeitado, na hipótese de não devolver o dinheiro surrupiado em quadrilha e não contar a verdade dos fatos a Justiça.
O mensalão tinha rol de provas imensamente menor do que o petrolão e chegou até onde pôde: José Dirceu. Em rigor, contra ele não tinha nenhuma prova material, mas o enredo do crime e a tese do domínio dos fatos o levou à prisão. Moralmente, está acabado para a sociedade e a vida pública, a mais cruel das penas.
Muitos se revoltaram com as penas menores dos políticos e maiores dos operadores. Não foi culpa do STF, mas do Código Penal. É que os beneficiários graúdos não dão as caras, nada assinam, quando muito incidem em um ou dois tipos criminais e, por isso, são menos apenados. O mesmo vai ocorrer com o petrolão, até que o crime de corrupção, como desejo, tenha a pena multiplicada à medida da importância política do réu seja ele o corrompido ou o corruptor.
Quanto ao petrolão, algumas facetas devem ser mostradas. Quem vai julgar não é o plenário do STF, mas a turma do ministro Teori, sujeitada a recursos, e que permanece com quatro juízes, passados já quase oito meses da saída do ministro Joaquim Barbosa.
O que o procurador-geral ofertou ao Supremo não foram denúncias, mas apenas nomes de políticos citados com maior ou menor profundidade nas investigações do juiz Moro, no Paraná, que não teve competência legal para inqueri-los, acareá-los ou investigá-los, porquanto gozavam de foro privilegiado. Só quem poderia fazer a investigação seria o STF. Janot apenas desistiu de sete denúncias que já havia feito ao Tribunal e pediu a abertura de 28 inquéritos policiais sob o controle do ministro Teori. Dos 54 citados, portanto, o que sobra são 28 pedidos de inquérito a serem feitos pela Polícia Federal, cujo comandante em chefe é a presidente da República, por meio do ministro da Justiça. O PMDB está irado justamente por desconfiar do sr. Cardozo. Alega que houve inserção de nomes maliciosamente. Em suma, as coisas estão no começo para a turma graúda. O Planalto está com as luzes acesas e os instrumentos disponíveis para mover os inquéritos.
Que se acautele a população contra possíveis decepções. Bem pode acontecer que o desenlace seja diverso do que todos esperam. A sociedade está tão agitada que toma a publicação dos nomes dos políticos como se fosse sentença com trânsito em julgado. Estamos muito distantes desse momento processual aguardado pela nação. No STF, não há sequer ação penal formalizada. O que ocorrerá em seguida? As etapas que se seguirão, salvo engano, serão as seguintes: o ministro Teori autoriza monocraticamente ,ou com o apoio de seus pares na turma a abertura de inquéritos contra a, b, ou c, ou então os nega. "Roma locuta, tollitur quaestio". No caso de aceitar o pedido de inquérito, serão ouvidos os indiciados e testemunhas. Podem ocorrer diligências, inclusive no exterior, e realização de provas periciais. Terminada a fase instrutória, o indiciado se tornará ou não réu denunciado pelo MP. A turma então julgará e promoverá a dosemetria das penas. Recursos são cabíveis ao pleno do STF em determinadas hipóteses.
Por último, é a primeira vez que o STF vai enfrentar processo dessa magnitude. O mensalão iniciou-se com uma denúncia do MP minunciosa e recheada de provas e indícios. O petrolão inicia-se sem denúncia alguma, mas com pedidos de inquéritos policiais que podem ou não ser aceitos pelo STF, que aliás não está acostumado a fazê-los, pois julga teses jurídicas que sequer envolvem fatos controversos. Será um teste demorado e complicado. A conferir. O segundo mandato de Dilma, em meio a temporais econômicos, financeiros, políticos e sociais, conviverá com os processos do "petrolão". Vale o ditado lusitano: "Quem semeia ventos, colhe tempestades".
Nenhum comentário:
Postar um comentário