É sob o impacto da "lista do Janot" e do zunzum crescente de uma "conversa de estadistas" entre Lula e Fernando Henrique que a presidente Dilma Rousseff faz hoje um pronunciamento no rádio e na TV. Para dizer o quê?
Dilma não é de fazer mea culpa, nem caprichou na maquiagem só para falar de flores, mostrar os efeitos da dieta Ravenna e saudar o Dia Internacional da Mulher. Muito menos para falar da meia centena de políticos da lista, que pega de jeito sua base de apoio.
Sobra a Dilma uma única opção: assumir, finalmente, a responsabilidade pelo ajuste fiscal, fundamental para corrigir os erros do primeiro mandato e sinônimo de medidas amargas para empresas, contribuintes e consumidores.
Até aqui, Dilma se recolheu a uma zona de conforto, trancada em palácios com petistas que pensam exatamente como ela, sem contraditório, enquanto o ministro Joaquim Levy bota a cara para assumir os anúncios impopulares. E quem tem de aprovar é o Congresso.
Não está funcionando. Levy é uma ilha cercada de súditos do império petista no BC, BB, CEF, BNDES e Petrobrás, sem falar no Planejamento. Nem o mercado nem os parlamentares são bobos. Todo mundo nota. Também não funciona porque Dilma tem a maior base aliada do planeta, mas o Congresso está ferido e em polvorosa com os 49 políticos sob investigação do Supremo Tribunal Federal pela roubalheira na Petrobrás.
E há aquele problemão. O PMDB não aceita o desgaste com as empresas - que financiam suas campanhas - para aprovar o fim das desonerações e o aumento de 150% na folha de pagamento. E o PT não topa bater de frente com sua base sindical - a começar da CUT -, aprovando endurecimento de seguro-desemprego e pensões.
Resumindo a história: cadê o ajuste fiscal? O gato comeu. No mínimo, está mastigando, devagar, calmamente, enquanto o circo pega fogo.
É aí que entra a crescente ansiedade de líderes do PT por algum tipo de, senão negociação, pelo menos conversa com o PSDB. E veem nas declarações particularmente cautelosas do senador José Serra uma boa porta de entrada.
Possível é, porque os grandes homens públicos (eles existem!) têm obrigação de pensar mais, melhor e mais longe. A crise na economia, na política e na ética saiu do âmbito do governo e é do País, e ninguém melhor do que o sociólogo FHC para entender isso.
Não é fácil, porém, dar uma mão para o PT, que virou as costas para os três grandes pactos nacionais pós-ditadura - eleição de Tancredo, Constituinte e governo Itamar Franco. E, agora, quando ele é o alvo, vem falar de pacto.
Mais: por trás de um político, há uma pessoa. Ponha-se no lugar de FHC, que, mal ou bem, com erros e acertos, estabilizou a economia, arrumou a casa e garantiu uma sucessão segura para Lula, mas depois teve de engolir o slogan "herança maldita" - que, injustamente, colou. E, ainda hoje, tem de engolir o "Foi o FHC" - que, justamente, não colou.
É nesse contexto que Dilma vai hoje à TV e ao rádio, mas não custa lembrar que seu histórico de pronunciamentos no primeiro mandato deixa muito a desejar. Num, ela botou o dedo na cara dos bancos, vangloriando-se de ter baixado os juros na marra. Bem... eles dispararam de novo e acabam de bater em 12,75%.
Noutro, subiu no palanque e só faltou pedir votos explicitamente ao anunciar a bengalada na conta de luz. Bem... a conta das empresas e dos domicílios também disparou e, entre outras coisas, faz um baita estrago na inflação. (Sem contar que a bengalada desestruturou o setor pelos próximos muitos anos).
Então, temos Dilma sem ter o que dizer, com o Executivo em ritmo de barata tonta, o Congresso em pé de guerra e o Judiciário arregaçando as mangas para o petrolão. E o País, perplexo, à deriva, à espera de um pacto dos sonhos, mas de viabilidade prática extremamente difícil.
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