GAZETA DO POVO - PR - 11/08
Mesmo eliminados e ouvindo provocações dos maiores rivais, brasileiros estão levando na esportiva e mantendo o clima que entusiasmou torcedores estrangeiros nesta Copa
As notícias divulgadas logo depois da goleada que tirou o Brasil da disputa pelo hexacampeonato eram preocupantes: em São Paulo, ataques a ônibus e uma tentativa de saque a uma loja; em Curitiba e na região metropolitana, vários ônibus foram apedrejados ou incendiados, com um assalto; Rio, Belo Horizonte e Salvador registraram brigas, na Fan Fest ou em bares onde a partida entre Brasil e Alemanha estava sendo exibida. É praticamente impossível dizer se as ocorrências foram realmente motivadas pela frustração com a eliminação do Brasil ou se foram obra de oportunistas que resolveram cometer delitos comuns sob o manto de uma suposta revolta popular (caso diferente foi o do torcedor alemão que, no Mineirão, perdeu a audição ao levar um soco quando comemorava um gol de sua seleção). Mesmo assim, foi o suficiente para o alemão Lukas Podolski, em sua mensagem de apoio aos brasileiros, dizer nas mídias sociais que “brigas nas ruas, confusões, protestos não irão resolver ou mudar nada”.
Por isso, o dia da semifinal entre Argentina e Holanda, em São Paulo, começou sob uma certa atmosfera de tensão. Temia-se pela reação dos brasileiros, maioria na Arena Corinthians, diante das inevitáveis provocações dos argentinos, tradicionais rivais futebolísticos e que não desperdiçam a chance de cantar superioridade sobre o futebol canarinho. Até então, com a exceção de episódios pontuais em algumas das cidades onde a Argentina jogou (e que podem até ser considerados inevitáveis pela presença, entre os argentinos, de alguns barras-bravas, como são chamados os membros violentos das torcidas organizadas), a convivência havia sido pacífica, com os cantos argentinos revidados não no braço, mas com a criatividade de novos refrões explorando os tradicionais temas da disputa entre vizinhos: o número de Copas conquistadas e as glórias de Maradona e Pelé. Mas era uma circunstância em que ambos os países seguiam sonhando com o título, que poderia vir justamente em uma final entre as duas seleções. Com o Brasil eliminado, os anfitriões poderiam reagir à provocação de outra forma.
Felizmente, não foi o que ocorreu. Antes da partida, os relatos de quem foi ao Itaquerão descreviam argentinos cantando como de costume, apenas incorporando o número sete às letras sempre que possível para recordar o placar da derrota brasileira no Mineirão, mas sem reações agressivas da torcida local. Depois do jogo, com a Argentina já classificada para a final no Maracanã, houve um único registro de briga envolvendo cerca de 20 brasileiros e argentinos, apartada por outros torcedores brasileiros antes mesmo da chegada da polícia. De resto, nossos vizinhos puderam fazer seu carnaval particular nas ruas de São Paulo.
O brasileiro, que já tem fama de acolhedor, teve sua reputação reforçada pela maneira como vem recebendo todos os estrangeiros que vêm torcer por suas seleções. Parte da ideia de que essa tem sido a “Copa das Copas” se deve justamente ao grau de interação entre brasileiros e torcedores de outros países, e aparentemente nem a derrota do time de Felipão na semifinal mudou esse panorama. O brasileiro pode estar frustrado, e com razão, mas não tem deixado que isso atrapalhe a festa daqueles que ainda têm chance de comemorar o título, ou daqueles que permanecem no Brasil para apreciar o bom futebol, ainda que suas seleções já estejam fora do páreo.
Se a Argentina for campeã no próximo domingo, certamente haverá piadas sobre como o Brasil é um bom anfitrião, pois gastou bilhões de reais para nossos maiores rivais futebolísticos fazerem a festa em nossa casa. Pois que seja; afinal, independentemente do vencedor, que a Copa termine com o mesmo clima em que começou, de confraternização.
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