Choque ou gradualismo para debelar a inflação
Será difícil para o Comitê de Política Monetária (Copom) encontrar motivos reais e objetivos, exclusivamente na inflação, para terminar o ciclo de aumento da taxa de juros que começou em abril de 2013 e já elevou em 3,75 pontos percentuais a taxa Selic, de 7,25% ao ano para 11% ao ano. O IPCA de abril pode vir ainda salgado, na casa dos 0,70%, e entre julho e novembro a inflação subirá, podendo exceder o teto de 6,5%.
O choque dos preços dos alimentos tende a ser parcial e temporário, mas isso já está no cenário de referência do relatório de inflação do Banco Central, que considera factível 6,1% de IPCA para o ano. Não está na conta do BC o risco crescente de racionamento de energia, que teria que ser tratado como um tremendo choque de oferta.
No comunicado da reunião de quarta feira o Copom deixou claro que a trajetória de elevação dos juros se encerra em breve, já agora com a Selic em 11% ao ano ou, no máximo, com mais uma elevação de 0,25 ponto percentual em maio. Ontem, os economistas do setor financeiro se dividiram entre essas duas hipóteses.
Afora o imprevisível, tudo indica que a inflação e o crescimento já estão dados para 2014. O IPCA na casa dos 6% e o PIB não muito diferente de 1,5% a 2%. A presidente Dilma Rousseff, portanto, encerraria seu governo com uma inflação média de 6,08% e crescimento médio de 2,01% do PIB. Do governo Sarney para cá ela perderia apenas para Lula na política de combate à inflação, cuja média foi de 5,79%. No crescimento, ganharia apenas de Collor de Mello, que no curto período de governo obteve 1,29% negativos. Mas certamente ganha de todos na menor taxa de desemprego de 5,1% (em fevereiro) que pode, contudo, não ser um fenômeno duradouro.
A grande indagação é sobre o próximo governo. Há questões que se apresentarão de forma contundente seja quem for o presidente eleito. Algumas delas já estão sendo objeto de debate entre os economistas, como a que discute o gradualismo ou tratamento de choque no combate à inflação. Tema que foi tratado no livro de 1970 do ex-ministro e professor Mário Henrique Simonsen, intitulado Inflação - Gradualismo versus Tratamento de Choque , onde ele expõe as opções e mostra que cada estratégia implica em maior ou menor custo social no curto e no longo prazo.
Para lidar com os preços represados dos combustíveis, energia e tarifas de ônibus, essa é uma decisão que terá que ser tomada logo no início de 2015. Se for feita a opção pela correção de preços de uma só vez, com um tratamento de choque, pode-se ter ganhos de expectativas e de confiança relevantes de forma que apenas uma parte do aumento dos preços controlados seja repassada para a inflação. Essa, porém, não seria uma questão isolada. Ela teria que se compor com decisões duras tanto na política fiscal quanto na monetária e, a partir desse ponto, começam a ser feitas as contas.
Há economistas que defendem um renovado esforço de superávit primário, de pelo menos 2,5% do PIB, desde que livre de receitas não recorrentes e de manobras contábeis. O país, portanto, não escaparia de um aumento da carga tributária mediante, por exemplo, com a extinção das desonerações da folha de salários feitas nos últimos anos e a volta da cobrança da Cide.
A um reforço fiscal se somaria, ainda, um novo aperto monetário para conter a inflação e promover a sua convergência para a meta.
Seguindo os argumentos de quem advoga o tratamento de choque, os juros reais hoje estariam aquém do necessário para derrubar a inflação.
Especialistas partem da seguinte conta: tomando 4% como a taxa neutra de juros, com a Selic em 11% e o IPCA em 6%, o juro real atual seria de somente 0,70%.
Há dois pressupostos nesse raciocínio: primeiro, que a correção geral dos preços represados aumentaria a inflação de 2015 para 7%; e, segundo, que cada ponto percentual a mais na Selic acima da taxa neutra reduz o IPCA em 0,4 ponto percentual, entre o quinto e o oitavo trimestre após a subida dos juros.
Por esses cálculos, o juro em janeiro de 2015 teria que saltar para 16,75% para se colher, em 2016, a inflação na meta de 4,5%.
No governo, não se acredita muito nessa história de juros neutro. Isso é igual a bruxa. Dizem que existe mas ninguém nunca viu , comentou um economista oficial.
Outra questão inquietante é a trajetória da inflação de serviços e, nesse aspecto, é curiosa a comparação com 2002. O IPCA acumulado em doze meses em dezembro daquele ano era de 12,5% e a inflação de serviços, de 5,47%. Hoje o IPCA de doze meses é de 5,7%, mas os serviços sobem 8,16%. Como este é um setor que não sofre a concorrência dos importados, fica sujeito ao descasamento entre oferta e demanda, emoldurado pelo pleno emprego.
O que é visível nas discussões em curso e que, certamente, vão embalar a campanha eleitoral é a dimensão nada desprezível dos problemas que se formaram e terão que ser enfrentados a partir do próximo ano para, mais à adiante, colocar a economia brasileira na trilha do crescimento.
A opção também pode ser pelo gradualismo, que parece menos penoso para a atividade econômica, já que a tendência do tratamento de choque é gerar um quadro mais recessivo no curto prazo embora de mais rápida recuperação. Tal decisão teria que ser confrontada com os custos sociais de cada opção.
O país experimentou a política de tratamento de choque no governo Castello Branco, com Roberto Campos e Octávio Gouvêa de Bulhões, e colheu as taxas de crescimento do milagre econômico . Nos Estados Unidos, Paul Volcker, presidente do Fed, preferiu combater a inflação de dois dígitos, no fim dos anos 70 e início dos 80, com um choque de juros.
Os sinais da presidente Dilma para os preços de energia, cujo ajuste deve começar só em 2015, sugerem gradualismo caso seja reeleita.
No ano em que o Plano Real completa duas décadas, o Brasil ainda se vê diante de um processo inflacionário persistente e resistente. Perdeu-se, em 2006, quando o IPCA caiu para 3,14%, a grande oportunidade de resolver esse assunto.
Será difícil para o Comitê de Política Monetária (Copom) encontrar motivos reais e objetivos, exclusivamente na inflação, para terminar o ciclo de aumento da taxa de juros que começou em abril de 2013 e já elevou em 3,75 pontos percentuais a taxa Selic, de 7,25% ao ano para 11% ao ano. O IPCA de abril pode vir ainda salgado, na casa dos 0,70%, e entre julho e novembro a inflação subirá, podendo exceder o teto de 6,5%.
O choque dos preços dos alimentos tende a ser parcial e temporário, mas isso já está no cenário de referência do relatório de inflação do Banco Central, que considera factível 6,1% de IPCA para o ano. Não está na conta do BC o risco crescente de racionamento de energia, que teria que ser tratado como um tremendo choque de oferta.
No comunicado da reunião de quarta feira o Copom deixou claro que a trajetória de elevação dos juros se encerra em breve, já agora com a Selic em 11% ao ano ou, no máximo, com mais uma elevação de 0,25 ponto percentual em maio. Ontem, os economistas do setor financeiro se dividiram entre essas duas hipóteses.
Afora o imprevisível, tudo indica que a inflação e o crescimento já estão dados para 2014. O IPCA na casa dos 6% e o PIB não muito diferente de 1,5% a 2%. A presidente Dilma Rousseff, portanto, encerraria seu governo com uma inflação média de 6,08% e crescimento médio de 2,01% do PIB. Do governo Sarney para cá ela perderia apenas para Lula na política de combate à inflação, cuja média foi de 5,79%. No crescimento, ganharia apenas de Collor de Mello, que no curto período de governo obteve 1,29% negativos. Mas certamente ganha de todos na menor taxa de desemprego de 5,1% (em fevereiro) que pode, contudo, não ser um fenômeno duradouro.
A grande indagação é sobre o próximo governo. Há questões que se apresentarão de forma contundente seja quem for o presidente eleito. Algumas delas já estão sendo objeto de debate entre os economistas, como a que discute o gradualismo ou tratamento de choque no combate à inflação. Tema que foi tratado no livro de 1970 do ex-ministro e professor Mário Henrique Simonsen, intitulado Inflação - Gradualismo versus Tratamento de Choque , onde ele expõe as opções e mostra que cada estratégia implica em maior ou menor custo social no curto e no longo prazo.
Para lidar com os preços represados dos combustíveis, energia e tarifas de ônibus, essa é uma decisão que terá que ser tomada logo no início de 2015. Se for feita a opção pela correção de preços de uma só vez, com um tratamento de choque, pode-se ter ganhos de expectativas e de confiança relevantes de forma que apenas uma parte do aumento dos preços controlados seja repassada para a inflação. Essa, porém, não seria uma questão isolada. Ela teria que se compor com decisões duras tanto na política fiscal quanto na monetária e, a partir desse ponto, começam a ser feitas as contas.
Há economistas que defendem um renovado esforço de superávit primário, de pelo menos 2,5% do PIB, desde que livre de receitas não recorrentes e de manobras contábeis. O país, portanto, não escaparia de um aumento da carga tributária mediante, por exemplo, com a extinção das desonerações da folha de salários feitas nos últimos anos e a volta da cobrança da Cide.
A um reforço fiscal se somaria, ainda, um novo aperto monetário para conter a inflação e promover a sua convergência para a meta.
Seguindo os argumentos de quem advoga o tratamento de choque, os juros reais hoje estariam aquém do necessário para derrubar a inflação.
Especialistas partem da seguinte conta: tomando 4% como a taxa neutra de juros, com a Selic em 11% e o IPCA em 6%, o juro real atual seria de somente 0,70%.
Há dois pressupostos nesse raciocínio: primeiro, que a correção geral dos preços represados aumentaria a inflação de 2015 para 7%; e, segundo, que cada ponto percentual a mais na Selic acima da taxa neutra reduz o IPCA em 0,4 ponto percentual, entre o quinto e o oitavo trimestre após a subida dos juros.
Por esses cálculos, o juro em janeiro de 2015 teria que saltar para 16,75% para se colher, em 2016, a inflação na meta de 4,5%.
No governo, não se acredita muito nessa história de juros neutro. Isso é igual a bruxa. Dizem que existe mas ninguém nunca viu , comentou um economista oficial.
Outra questão inquietante é a trajetória da inflação de serviços e, nesse aspecto, é curiosa a comparação com 2002. O IPCA acumulado em doze meses em dezembro daquele ano era de 12,5% e a inflação de serviços, de 5,47%. Hoje o IPCA de doze meses é de 5,7%, mas os serviços sobem 8,16%. Como este é um setor que não sofre a concorrência dos importados, fica sujeito ao descasamento entre oferta e demanda, emoldurado pelo pleno emprego.
O que é visível nas discussões em curso e que, certamente, vão embalar a campanha eleitoral é a dimensão nada desprezível dos problemas que se formaram e terão que ser enfrentados a partir do próximo ano para, mais à adiante, colocar a economia brasileira na trilha do crescimento.
A opção também pode ser pelo gradualismo, que parece menos penoso para a atividade econômica, já que a tendência do tratamento de choque é gerar um quadro mais recessivo no curto prazo embora de mais rápida recuperação. Tal decisão teria que ser confrontada com os custos sociais de cada opção.
O país experimentou a política de tratamento de choque no governo Castello Branco, com Roberto Campos e Octávio Gouvêa de Bulhões, e colheu as taxas de crescimento do milagre econômico . Nos Estados Unidos, Paul Volcker, presidente do Fed, preferiu combater a inflação de dois dígitos, no fim dos anos 70 e início dos 80, com um choque de juros.
Os sinais da presidente Dilma para os preços de energia, cujo ajuste deve começar só em 2015, sugerem gradualismo caso seja reeleita.
No ano em que o Plano Real completa duas décadas, o Brasil ainda se vê diante de um processo inflacionário persistente e resistente. Perdeu-se, em 2006, quando o IPCA caiu para 3,14%, a grande oportunidade de resolver esse assunto.
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