GAZETA DO POVO - PR - 04/10
O especialista em questões ambientais Hervé Kempf, de sólida formação acadêmica e com vasta experiência no jornalismo francês, publicou um livro intrigante sob o título Como os ricos destroem o planeta. Ele foca suas críticas contundentes em dois tipos – os países ricos e as pessoas ricas – que, segundo ele, são os responsáveis pela destruição dos recursos naturais e os culpados pela devastação que tornará o bem-estar mundial inviável.
Quanto aos países ricos – Estados Unidos à frente –, o autor os acusa de terem adotado um estilo de vida e um padrão de ostentação e consumo que não podem ser universalizáveis. O consumo por habitante nos Estados Unidos transformou o homem americano em uma máquina de comprar, destruir e acumular lixo que não tem nem terá precedente na história.
Comecemos pelo petróleo. Com população equivalente a 4,5% do total de habitantes na Terra, os EUA consomem 25% de todo o petróleo produzido no mundo. A China tem 25 carros para cada mil habitantes, o Brasil tem 140 e os EUA têm 800. Só que a população da China é de 1,3 bilhão de habitantes – contra 320 milhões dos EUA e 201 milhões do Brasil. Se a China apenas igualasse o Brasil em número de carros para cada grupo de mil pessoas, nem todo o petróleo da Terra bastaria para sustentá-los.
Mas, além de dirigir suas críticas aos países ricos e seu estilo de vida enlouquecido e gastador, Hervé Kempf acusa as pessoas ricas – e não só elas, mas também todo cidadão que, tendo renda, se põe a consumir freneticamente sem qualquer consciência social ou ambiental.
O livro resgata um esquecido economista do fim do século 19: Thorstein Veblen, que ficou conhecido por assacar duras críticas contra a busca incessante por consumir mais e mais. Segundo Veblen, as necessidades concretas da existência humana são finitas. A partir daí, o excesso de produção é ensejado pelo desejo mórbido do ser humano de exibir riquezas a fim de se diferenciar do outro, o que alimenta o consumo ostentatório e o desperdício generalizado.
Além dos bens e serviços necessários para atender ao que Veblen chamou de “as finalidades úteis”, são o jogo social e a ansiedade consumista que estimulam o consumo. Sobre isso, Kempf faz referência ao consumo ensandecido dos hiper-ricos – que ele chama de “loucos tristes” –, lembrando a “guerra dos iates” de 1997, relatada pela revista Forbes, quando os ricaços executivos de grandes corporações disputavam entre si quem tinha o iate maior e mais opulento.
Mas não são só eles: não é pequeno o número de pessoas que, em três anos, já destruíram seis aparelhos iPhone. Como os executivos dos fabricantes não são bobos (alguns figuravam na guerra dos iates), eles mudam esses brinquedos a cada seis meses, alterando quase nada de suas funções (a maioria delas sem nenhuma utilidade real), e o mundo segue destruindo seus recursos e pouco se lixando para a pobreza extrema das favelas e a miséria total da África subsaariana.
Tão logo terminei o livro de Hervé Kempf, caiu-me às mãos um livro otimista, intitulado Abundância, cuja manchete de capa diz que “o futuro é melhor do que você imagina”. São duas visões opostas, as quais vale a pena ler e comparar, após o que talvez seja possível tirar conclusões mais sólidas a respeito de para onde vai o planeta.
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