O ESTADÃO - 22/10
Só uma coisa era certa no leilão de concessão do gigantesco campo petrolífero de Libra, localizado na Bacia de Santos: seria impossível escapar de uma enxurrada de críticas ao modo como o governo modelou, regulou e, afinal, licitou o maior achado de petróleo, no Brasil, em todos os tempos.
Os questionamentos percorriam todos os pontos cardeais do espectro político e enfiaram no mesmo balaio de insatisfeitos entes tão distantes entre si quanto representações sindicais de petroleiros, investidores e analistas do mercado financeiro, especialistas e acadêmicos, com um sem fim de eteceteras que permite incluir até mesmo setores do próprio governo.
Concluído o leilão, de todo modo, não se pode dizer que tenha sido um sucesso, mas também não é possível concluir que fracassou totalmente. Um único consórcio apresentou proposta e esta, naturalmente, ficou no lance mínimo, sem nenhum ágio, portanto. Mas a presença de multinacionais privadas do porte da anglo-holandesa Shell e da francesa Total no grupo vencedor surpreendeu positivamente. Acabou dando empate sem gols no Fla-Flu de Libra.
Depois do resultado do leilão, os debates mais ideológicos em torno do regime de licitação dos campos do pré-sal – concessão versus partilha – talvez fiquem, pelo menos de início, em segundo plano ante a discussão sobre o fôlego da Petrobrás para encarar suas obrigações como operador compulsório em todos os campos do pré-sal. Até porque, no fim das contas, as regras da licitação pareceram misturar as coisas.
O bônus de assinatura de R$ 15 bilhões, nas nuvens, por exemplo, é mais típico de leilões em regime de concessão. Difícil escapar da impressão de que foi imposto, na verdade, para fins de refresco na cambaleante política fiscal do governo. E de que não colaborou para afugentar concorrentes, assim como a presença compulsória da Petrobrás nos eventuais consórcios concorrentes. A disparada nas cotações dos papéis da empresa, que, além dos 30% definidos nas regras da licitação deterá outros 10% na partilha do óleo extraído, como integrante do consórcio vencedor, na sequência do desfecho do leilão, indica mais alívio para os investidores diante da oferta mínima ganhadora do que expectativas de ganhos com a futura exploração das jazidas.
Se houvesse concorrência e ágio, a Petrobrás, vivendo um período de fragilidade financeira, teria sido ainda mais exigida na composição dos consórcios. Como parte das exigências do leilão de Libra, a empresa terá de transferir ao Tesouro, em princípio antes de dezembro, montante de R$ 6 bilhões, equivalente a 40% do bônus de assinatura, que terá de ser pago pelo conjunto das empresas que formam o consórcio vencedor. Isso sem falar na parcela a ser destinada ao desenvolvimento do campo, estimado no total em R$ 100 bilhões.
Observados em perspectiva, o desenrolar e o desfecho do histórico leilão do campo de Libra apontam para a necessidade de aprimorar o modelo de licitação nos próximos campos do pré-sal. A presença de grandes operadoras multinacionais e privadas, com capacidade gerencial e tecnológica para reforçar a tarefa da Petrobrás na exploração bem sucedida do imenso potencial do campo licitado, só minimiza o fato de que qualquer leilão com apenas um concorrente expõe problemas em sua modelagem. Leilão é quase sinônimo de competição.
Dá para entender a ideia de que a Petrobrás deve ocupar todos os espaços possíveis, não só como forma de preservar o controle nacional na exploração de uma matéria-prima estratégica, mas também assegurar à empresa possibilidade de se manter, permanentemente, no estado da arte na tecnologia de processo e de produção de petróleo e gás. Porém, esses aspectos, sem dúvida relevantes, podem ser alcançados sem espantar competidores dos próximos leilões, nem obrigar a empresa a se lançar numa missão excessivamente ambiciosa – para não dizer impossível.
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