ZERO HORA - 31/10
O governo argentino desferiu um golpe mortal na liberdade de expressão ao enquadrar o Grupo Clarín na chamada Lei de Meios, chancelada esta semana pela Suprema Corte do país. Sob o rótulo de democratização dos meios de comunicação, a legislação desestrutura e fragiliza a independência do principal grupo do país num momento em que o governo da presidente Cristina Kirchner, em queda de popularidade, direciona investimentos publicitários para as empresas alinhadas com sua administração. A referida lei, promulgada em 2009, teve claramente um objetivo bem menos nobre do que a alegada tentativa de pulverizar o controle dos veículos e evitar monopólios. O que o governo pretendeu foi atingir especificamente o Clarín, que atua de forma independente e não se alinha aos interesses da Casa Rosada.
O constrangimento criado tem exemplos na vizinhança e segue a lógica de regimes incapazes de conviver com o questionamento da imprensa e das mais variadas formas da liberdade de expressão. Por isso a situação argentina não pode ser desvinculada de um contexto de democracias autoritárias da América Latina, como Venezuela e Equador, que também tentam sufocar seus críticos, estando ou não nos meios de comunicação. O argumento do kircherismo, de que a lei evita monopólios, não se sustenta. Há, sim, concorrência no setor na Argentina, e essa tem sido potencializada, ali e em todo o mundo civilizado, pelas novas mídias virtuais, que desafiam modelos consagrados, constrangem regimes antidemocratas e facilitam a produção e a transmissão de informação e entretenimento.
É evidente que o incômodo do qual o governo tenta se livrar é o da imparcialidade e da diversidade, ao mesmo tempo em que, como alertam organismos internacionais ligados ao jornalismo, contempla com fartas verbas da propaganda oficial e outros afagos os setores alinhados às suas ambições. A lei que atingiu o Clarín é a expressão do poder discricionário do Estado contra uma empresa punida por sua independência.
A decisão da Suprema Corte deve ser acatada, como todas as deliberações da Justiça, o que não significa obediência sem questionamentos. O grupo estuda a possibilidade de recorrer a cortes internacionais, como último recurso para a preservação não só de sua estrutura e da sua história, mas do direito de continuar atuando com autonomia e imparcialidade. A tentativa de silenciar parte da imprensa, antes de provocar prejuízos econômicos a um determinado grupo empresarial, significa uma afronta a todos os que buscam informações, em quaisquer veículos, como exercício permanente da liberdade de expressão.
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