FOLHA DE SP - 14/09
RIO DE JANEIRO - Quando o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, encerrou a sessão na quinta-feira, com o placar de 5 a 5 entre os ministros, e adiou para a semana que vem o voto do ministro Celso de Mello sobre a aceitação dos "embargos infringentes", a primeira palavra que veio à cabeça de todos foi: suspense. Vamos passar a semana em suspense, à espera de um voto que não sabemos qual é --pensou-se. E falou-se de Hitchcock a respeito de Joaquim Barbosa.
Mas a comparação não procede. Em Hitchcock, o suspense não consiste em sonegar informação à plateia, mas, ao contrário, dar- lhe toda a informação possível -- e fazer com que ela sofra por causa disso. Exemplos. Em "Suspeita" (1941), o espectador vê Cary Grant subir a escada com um copo de leite para sua mulher, Joan Fontaine, e "sabe" que aquele leite está envenenado. Para que a plateia não tirasse os olhos do copo, Hitchcock pôs uma lâmpada dentro dele.
Em "Janela Indiscreta" (1954), James Stewart, preso a uma cadeira de rodas, vê pelo binóculo que o assassino está voltando para casa e vai flagrar Grace Kelly, que foi até lá para bisbilhotar. Stewart assiste a tudo de longe e sofre, porque não pode fazer nada; daí, sofremos com ele. Em "O Homem que Sabia Demais" (1956), o público do concerto sabe que o tiro contra o primeiro-ministro será disparado quando o percussionista tocar os címbalos --e Hitchcock faz a câmera passear pelas notas da partitura, para mostrar que o tiro não tarda.
No caso do julgamento em Brasília, é exatamente o contrário. Só o ministro Celso de Mello sabe no que votará --ou no que votou, já que parece ter deixado sua decisão num envelope fechado. Pelos cânones hitchcockianos, isso não é suspense, mas mistério.
E no melhor estilo de Agatha Christie, com o ministro no papel de Hercule Poirot.
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