segunda-feira, agosto 26, 2013

Só vejo vantagens - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 26/08
"Venho tratar de pessoas, de estruturas, não"
MIGUEL DALPUIM, médico português atraído pelo programa Mais Médicos


Sem tolices, por favor. Queriam o quê? Que, precisando contratar médicos para fixar no interior, o governo não o fizesse só porque os nossos têm outros planos? Ou então que contratasse estrangeiros, mas não cubanos porque eles vivem sob uma ditadura? Com quantas o Brasil mantém relações? Sabe em que governo o Brasil reatou relações diplomáticas com Cuba? No do conservador José Sarney. Pois não é?

DESEMBARCARAM por aqui no último fim de semana os 400 médicos cubanos que aceitaram trabalhar durante três anos nos 701 municípios rejeitados por brasileiros e estrangeiros em geral inscritos no programa Mais Médicos. São municípios que exibem os piores índices de desenvolvimento humano do país, 84% deles situados no Norte e no Nordeste. Os nossos médicos brancos e de olhos azuis não topam servir onde mais precisam deles.

MÉDICOS BRANCOS e de olhos azuis... (Olha o racismo aí, gente!) O que eles querem mesmo é conforto, um consultório para chamar de seu e bastante dinheiro. Igarapés? Mosquitos? Casas de pau a pique? Internet lenta? Medicina, em parte, como uma espécie de sacerdócio? Argh! Mas a Constituição manda que o Estado cuide da saúde das pessoas. E, para isso, ele lançou um programa. Acusam o programa de ter sido concebido sob medida para reeleger Dilma.

OUTRA VEZ, SUPLICO: "sin tonterias, por favor". Queriam o quê? Que podendo atender o povo e ganhar uns votinhos ela abdicasse dos votinhos? Sarney (ele insiste em voltar!) inventou o Plano Cruzado em 1986 para manietar a inflação. Manietou-a tempo suficiente para vencer a eleição daquele ano. Com a falência do plano, foi apedrejado no Rio. O Plano Real elegeu Fernando Henrique. O que restou do plano o reelegeu. O Bolsa Família reelegeu Lula.

AH, MAS UM programa ambicioso como o Mais Médicos deveria ter sido discutido pela sociedade antes de começar. Deve ter sido discutido, sim, pelo governo, ouvindo também seus marqueteiros. Importa que funcione bem. Do contrário, a gente mata a bola no peito e sai por aí repetindo até perder a voz: "Eu não disse? Não disse?" Outra coisa: quem sabe o fracasso do programa não derrota Dilma? Hein? Hein?

MÉDICO CUBANO não fala português direito! (Ora, tenham dó. Eu passo.) Não podem ser tão bem preparados. Podem e são. Estão em dezenas de países. Até no Canadá. Até na Inglaterra. Ministro da Saúde, José Serra foi a Cuba conhecer como funcionava o sistema de atendimento médico comunitário. Voltou encantado. Sei: coitado do médico cubano! A maior parte dos R$ 10 mil mensais que embolsará ficará com o seu governo. E ele não poderá trazer a família.

TAMBÉM TENHO pena deles. E deixo aqui como sugestão: entre tantas as passeatas marcadas para 7 de setembro, porque não fazemos uma pedindo o fim da ditadura cubana? Ou pelo menos melhores salários para os médicos da ilha? Já pensou? Abrindo a passeata, representantes de entidades médicas. De jaleco. Atrás, um mar de bandeiras vermelhas para animar a turma. Fechando a passeata, o bloco dos vândalos. E tudo filmado pelos ninjas!

COMPARTILHO O receio de os médicos estrangeiros se frustrarem com a carência de equipamentos no Brasil. Se eles faltam até nas maiores cidades, imagine nas terras do fim do mundo? Ainda assim é melhor ter médicos a não tê-los. Em certos casos só se resolve problema criando problema. Haverá sempre o recurso passeata. Se negarem o que pedimos... Se rolar grossa pancadaria... Cuide-se, Dilma!

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