VALOR ECONÔMICO - 07/08
O crescimento da economia brasileira se beneficiou em boa medida, entre 2002 e 2012, do fator trabalho. Tanto a demografia quanto o mercado de trabalho, bem como os ganhos de produtividade, ajudaram a aumentar a taxa de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) em relação ao período anterior. A má notícia é que, daqui em diante, esses fatores darão contribuição bem mais modesta. Se a ambição é crescer acima de 2% ao ano, o país terá que fazer reformas para elevar a produtividade do trabalho e a taxa de investimento da economia.
O ritmo de crescimento da população brasileira vem caindo há várias décadas. O país se aproxima também do fim do chamado bônus demográfico, fenômeno que ocorre quando a força de trabalho cresce a um ritmo mais veloz que o da população. Já o mercado de trabalho exibe números perto do pleno emprego, o que igualmente indica, doravante, baixa contribuição ao PIB.
Entre 1992 e 2002, a população brasileira cresceu, em média, 1,5% ao ano. A taxa de participação - relação entre o percentual de pessoas em idade de trabalhar e a população - avançou a um ritmo anual de 0,5%. Isso fez com que o impulso demográfico ao crescimento da economia atingisse 2%.
No mercado de trabalho, a taxa de atividade - a proporção da População Economicamente Ativa, que considera empregados e desempregados, e a PIA (População em Idade Ativa) - recuou 0,1% ao ano, mantendo-se praticamente estável entre 1992 e 2002. Na prática, significa dizer que o mercado de trabalho subtraiu 0,1 ponto percentual do impulso dado por fatores demográficos à alta do PIB. Entre 1992 e 2002, o Brasil teria crescido, portanto, 1,9% ao ano, independentemente do avanço da produtividade.
Quando se observa o período seguinte (2002-2012), conclui-se que, diante do crescimento médio anual da população de 1,1% e da taxa de participação em 0,4%, a demografia contribuiu com 1,5 ponto percentual para a expansão do PIB. Assim como na década anterior, a taxa de atividade caiu 0,1% ao ano. Em compensação, a taxa de emprego acelerou - 0,7% ao ano, em média -, em grande medida por causa da confiança dos agentes no rumo da política econômica.
O mercado de trabalho contribuiu, assim, com 0,6 ponto percentual para o PIB no período mencionado, o que, somado à contribuição da demografia, permitiu alta de 2,1% no crescimento anual, independentemente da produtividade.
Economistas do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da FGV, estimam que, no período atual (2012-2022), a população crescerá a uma média anual de 0,6%. Já a expansão da taxa de participação cairá para 0,3%, refletindo o início do esgotamento do bônus demográfico. Sendo assim, a demografia deve diminuir sua contribuição para o PIB de 2,1 para 0,9 ponto percentual entre as duas décadas.
O Ibre acredita que a taxa de atividade pode melhorar um pouco na década atual, crescendo 0,1% ao ano, em média. O problema é a taxa de emprego. Numa visão otimista, é provável que ela fique estável depois de passar por fase de forte aquecimento. Nesse sentido, sua contribuição para o PIB será ligeiramente superior a zero.
"A notícia preocupante é que os 2% vão se transformar em 1% nos dez anos a partir de 2012. O nível mínimo de crescimento dado apenas pela demografia e pelo mercado de trabalho - não levando em conta, portanto, os ganhos de produtividade - sofreu um tombo e provavelmente ficará em torno de 1% entre 2012 e 2022", diz o diretor do Ibre, Luiz Guilherme Schymura. "A conclusão imediata é que, para que o PIB brasileiro cresça ao ritmo das décadas mais recentes, cujos números não foram motivo de grandes comemorações, a produtividade do trabalho terá que se elevar a uma taxa anual um ponto percentual superior à dos períodos anteriores."
O desafio é gigantesco. No primeiro período analisado - 1992-2002 -, a produtividade avançou, em média, 0,9% ao ano, elevando para 2,9% a capacidade de crescimento da economia. Entre 2002 e 2012, cresceu 1,4% ao ano, o que permitiu um avanço anual médio do PIB de 3,5%. O problema é que, desde 2011, a alta da produtividade tem sido inexpressiva.
No período recente, contribuiu para a aceleração da produtividade a formalização do mercado de trabalho. Outro fator positivo foi o crescimento de 4,3% ao ano da produtividade do setor agropecuário, um dos mais dinâmicos da economia.
No primeiro caso, é difícil saber se a formalização crescerá no ritmo observado nos últimos anos. Provavelmente, não o fará, a não ser que o governo adote medidas para flexibilizar o mercado de trabalho, reduzindo o custo de contratação. No segundo caso, a absorção de trabalhadores agrícolas, decorrente do contínuo aumento da produtividade do agronegócio, não tem escala, adverte Schymura, para mudar o curso dessa variável.
Resta ao país, se quiser acelerar o PIB, criar condições para ampliar a taxa de investimento da economia - o chamado aprofundamento do capital (o aumento do uso de máquinas e equipamentos por trabalhador) -, hoje estacionada em 18,45% do PIB. Isso depende, entre outros fatores, da elevação da poupança doméstica, que no Brasil tem pouco estímulo para crescer.
Além disso, o desafio da produtividade do trabalho passa pelo aprimoramento urgente da educação e pela realização de uma série de mudanças institucionais que estimulem o aumento da produtividade total dos fatores (PTF). A lista de tarefas é extensa, lembra Shymura, que trata do tema na Carta do Ibre que será divulgada hoje. São temas que, na sua maioria, foram relegados durante os tempos de bonança por razões político-ideológicas. Seu enfrentamento só produzirá efeitos a médio e longo prazo.
"As mudanças têm a ver com a absorção de tecnologia e a racionalização do processo produtivo. O que não falta, nesse caso, são tarefas a realizar, como um sistema tributário que reduza o custo de observância da legislação; a melhora do ambiente de negócios em geral e a diminuição do custo de investimento em infraestrutura. Neste último item, uma agenda que se desenha é a de diagnosticar as causas da dificuldade do Estado brasileiro de realizar empreendimentos complexos, como estradas, portos, usinas hidrelétricas, etc", explica Schymura.
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