O GLOBO - 10/07
O plebiscito morreu, viva a reforma política. Se tiverem juízo, os políticos não darão por encerrado o assunto e tratarão de alcançar um consenso, inatingível nos anos anteriores, para reformar os sistemas eleitoral e partidário hoje vigentes, que favorecem o distanciamento entre eleitor e eleito, dando a sensação ao cidadão de que não está representado pelo Congresso e pelos partidos que nele atuam.
É verdade que essa não é a principal reivindicação das ruas, apenas pareceu à presidente Dilma a mais simples resposta para acalmar os insatisfeitos, transferindo para nosso sistema representativo as culpas que deveria pelo menos dividir. Independem do Congresso a melhoria da gestão do dinheiro público e a eficiência do infindável Ministério, embora a distorção do sistema de presidencialismo de coalizão esteja na raiz de nossos problemas.
O Congresso, tão alvejado justamente por críticas quanto ao seu comportamento, não tem mais tempo para adiar reformas de hábitos e costumes no fundo antidemocráticos, e, embora tenha razão em recusar a realização de um plebiscito sobre a reforma política, tem a obrigação de promovê-la, sob pena de se autonomear o responsável pelo emperramento das mudanças exigidas pela cidadania nas ruas do país.
Um exemplo claro é o fim de eleições secretas. Existem ocasiões em que é importante que haja votação secreta, para apreciação de temas em que o político pode ficar exposto a pressões externas e do próprio Executivo. Mas eleição para as presidências das duas Casas, e das respectivas comissões, deveria ser aberta, e, para tanto, basta mudar os regimentos internos.]
Há ainda o perigo de o PT tentar jogar as ruas contra os políticos, para recuperar sua hegemonia popular, mas aí estará cometendo um suicídio político que dificultará ainda mais as alianças que terá de montar para a eleição de 2014, tanto a nível nacional quanto para as eleições estaduais.
A queda de popularidade da presidente Dilma produziu um efeito imediato: o rancor que os políticos da base governista nutriam pela soberana encontrou liberdade para se revelar, sem receio de retaliação. Há também nessa miscelânea partidária, que nunca respeitou programas partidários, mas se nutre com os regalos do poder, os baderneiros que, a exemplo dos das manifestações com televisões e computadores, se aproveitam do momento para saques aos cofres da União, aumentando o preço de seu apoio político.
O governo está neste momento à deriva e exposto à fome insaciável de nacos do poder de uma parte ponderável de sua base aliada, que, ao mesmo tempo em que raspa o tacho, se oferece para os adversários, na percepção de que a sucessão presidencial está zerada.
Se o governo cair na esparrela de querer disputar nas ruas a hegemonia dos movimentos sociais, pode dar com os burros n´água, como já aconteceu nas primeiras manifestações. Mas pode também criar uma crise institucional. A situação da presidente Dilma é bastante delicada neste momento, pois as medidas que deveria tomar para tentar readquirir o controle da situação exigem sacrifícios que ela não está disposta a assumir, especialmente porque os eleitores estão prestes a ganhar o poder do voto nas urnas.
A antecipação da corrida presidencial, se durante um período foi importantes para fixá-la como a candidata oficial do PT à reeleição, paralisou seu governo e aumentou o período de campanha, antecipando as reivindicações dos políticos aliados para a formação de coligações que definem o tempo de televisão para a propaganda eleitoral.
Quando tudo parecia congelado eternamente, com Dilma franca favorita, essa pressão ainda era controlável, pois ela estava dando as cartas. Agora, a rejeição ao estilo autoritário da presidente encontra terreno fértil para vingar, e as negociações de bastidores correm soltas. O PMDB, parceiro oficial na coligação, perdeu o controle de suas próprias bases, especialmente devido à atuação de seu líder Eduardo Cunha, a quem o vice Michel Temer prometeu controlar. Dilma já sabe que ele é incontrolável, assim como o PMDB em tempos de crise.
Já parece impossível manter a unidade do PMDB no apoio à reeleição de Dilma, tendo o partido voltado ao seu estado anterior: cada seção regional decide o melhor caminho.
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