O GLOBO - 15/07
Símbolo da democracia direta, a "Ágora", a praça em que o povo discutia seu destino nas cidades-estado gregas, ficou no passado à medida que as sociedades se tornaram mais complexas e cresceram as populações. A partir da Revolução Francesa e com aperfeiçoamentos nos séculos XIX e XX, a democracia representativa se consolidou como o mais estável dos regimes abertos.
Mas a ideia de se criar canais para saudáveis interferências do eleitor no processo político, além do voto, está sempre presente. Há, no caso americano, não apenas a utilização à larga de plebiscitos, mas também do instrumento do "recall", pelo qual o eleito pode perder o mandato por decisão de seu eleitorado, recurso facilitado pela existência do sistema de votação distrital.
No Brasil, existe a possibilidade de propostas de leis de origem popular, respaldadas em centenas de milhares de assinaturas comprovadas de eleitores, tratadas no Congresso como qualquer outro projeto. O exemplo mais conhecido da utilização do recurso é a Lei da Ficha Limpa, cuja proposta surgiu da mobilização de organizações sociais, com apoio da Igreja Católica, para impedir que donos de prontuários policiais e condenados em primeira instância pela Justiça e órgãos colegiados na esfera administrativa possam se beneficiar das imunidades de cargos eletivos.
Já a realização de um plebiscito para se definir a agenda de uma reforma política avança alguns sinais. O primeiro deles é a inadequação do tema à consulta popular. Plebiscito é indicado apenas para assuntos de fácil entendimento geral e diante dos quais sejam cabíveis respostas diretas - "sim" ou "não".
Foi assim no plebiscito sobre a continuação ou não do regime parlamentarista no governo João Goulart, em 1963 (voltou o presidencialismo), e em sondagem idêntica em 1993, quando a sociedade rejeitou a proposta da volta ao regime de gabinete. De maneira diversa, uma reforma política envolve questões muito intrincadas, a ponto de impedir que o eleitorado possa se posicionar, de maneira consciente, contra ou a favor de inúmeros aspectos de várias mudanças possíveis na legislação política. E o absoluto conhecimento de todos sobre o assunto sob consulta é um pré-requisito determinado pela Constituição, como alerta a presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Cármen Lúcia, ministra do Supremo.
Apesar das pressões do Planalto, o Congresso arquivou a proposta do plebiscito para 2014, até porque ficou evidente a impossibilidade de se aprovar qualquer mudança na legislação a até um ano das eleições, como também estabelece a Carta. Decidiu-se criar um grupo de trabalho para propor uma reforma. E o que for aprovado deverá ser levado a referendo, para entrar em vigor nas eleições de 2016. Esta é a fórmula mais sensata de se ouvir diretamente o eleitor sobre o tema, sem riscos elevados de manipulação política.
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