FOLHA DE SP - 21/05
Relevante é o consenso que se forma a respeito da necessidade de combate à desindustrialização
Nos anos 80 e início dos 90 do século passado, por conta de inúmeros tropeços na política econômica e de tenebrosas crises de hiperinflação, formou-se na sociedade brasileira o consenso de que o país deveria ter como prioridade absoluta a conquista da estabilidade.
Por razões que não vêm ao caso, diversos planos de estabilização fracassaram.
Já se passaram quase duas décadas desde que o lançamento do Plano Real trouxe a desejada estabilidade. Foi, sem dúvida, uma conquista extraordinária. Sem a inflação galopante que destruía o poder aquisitivo principalmente dos mais pobres, o país pôde avançar em produção, criação de empregos e distribuição de renda.
Vivemos hoje um novo momento na economia brasileira. Uma das perguntas mais recorrentes é "por que o Produto Interno Bruto não cresce ou cresce pouco?" Os diagnósticos são diversos e variam de acordo com a ideologia e o viés político dos especialistas.
É natural que a crise global, que já dura cinco anos e tem a maior intensidade desde a grande depressão dos anos 30, está entre as causas desse baixo crescimento. Mas não se pode colocar toda a culpa na crise externa. A novidade, nos últimos meses, é que começa a se formar o consenso de que não será possível alcançar um ritmo de expansão econômica sustentável sem uma reindustrialização do país.
O Brasil enfrentou nas últimas décadas um sensível declínio da indústria, tendência que tem sequência nos dias atuais. Um levantamento feito pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), com base em dados do Ministério do Desenvolvimento e do IBGE, mostra que continua a aumentar o coeficiente de importação da indústria brasileira, ao mesmo tempo em que diminui o coeficiente de exportação.
No início de 2007, por exemplo, as importações representavam 17,8% da produção industrial do país e as exportações, 21,1%. No primeiro trimestre deste ano, esse coeficiente havia caído para 18,2% no caso das exportações e aumentado para 24,1% no das importações. São claros sinais de desindustrialização do país, que a cada ano exporta menos manufaturados e se torna mais dependente de itens importados.
O consenso que se estabelece, seguramente benéfico para a economia, é o de que, a exemplo de outros países, o Brasil não consegui- rá alcançar níveis elevados de desenvolvimento sem um movimento vigoroso de reindustrialização.
Não é objetivo deste artigo sugerir formas pelas quais o país deve promover essa reindustrialização --pretende-se, apenas, enaltecer o surgimento da concordância ampla que se estabelece sobre isso.
Ainda que as terapias sugeridas por economistas sejam em geral bastante conflitantes, é muito importante haver aceitação geral do diagnóstico. Num interessante debate entre os professores Luiz Gonzaga Belluzzo e Edmar Bacha, publicado pelo "Valor", Bacha sugeriu o que chamou de "plano real da indústria", que teria três etapas não necessariamente sequenciais. Na primeira, seria feita forte redução da carga tributária incidente sobre as empresas, uma etapa fiscal, que exigiria controle de gastos do governo. Na segunda, haveria desvalorização do real com redução de tarifas de importação, uma espécie de troca de tarifas por câmbio. Na terceira, acordos comerciais para valer com União Europeia, Alca e outras regiões do mundo.
Belluzzo concordou com o diagnóstico, embora nem tanto com a terapia, preocupando-se principalmente com o movimento da taxa de câmbio no caso de uma flutuação livre da moeda. Eu acrescentaria uma observação sobre a necessidade de uma política industrial que pudesse levar em conta vocações nacionais, oportunidades globais e comprometimento com inovação. Não parece razoável deixar o processo de reindustrialização totalmente ao sabor do mercado.
Relevante, porém, é o consenso que se forma a respeito da necessidade de combate à desindustrialização. Afinal, o desempenho da indústria brasileira tem sido decepcionante. No ano passado, com queda de produção de 2,6%, foi o pior entre 25 emergentes, segundo a consultoria britânica Economist Intelligence Unit. Até a indústria de países fortemente atingidos por crise política, como o Egito, teve desempenho melhor que a brasileiro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário