FOLHA DE SP - 15/05
Tentativas de manter o desemprego reduzido à custa de inflação alta produzem só mais inflação
Depois do insucesso dos últimos anos, nosso ministro da Fazenda, autodenominado "levantador de PIB", parece ter desistido do halterofilismo econômico.
Agora, diz o ministro, "a geração de empregos formais no país é tão ou mais importante do que o PIB".
Caso algum dos 18 leitores tenha uma epifania com a imagem de uma raposa desprezando um suculento cacho de uvas, peço que não se culpe pelo clichê.
Também passei por isso e concluí que o problema não era meu, mas do ministro, que não consegue escapar dos clichês nem quando o país enfrenta uma situação inédita.
Ou melhor: não consegue escapar deles principalmente quando o país enfrenta uma situação inédita.
De fato, o ministro -conhecido na imprensa internacional como o duende previsor- prometia até há pouco crescimento acelerado do PIB e, publicamente, fez pouco de previsões do setor privado que apontavam para um desempenho muito inferior àquele por ele garantido.
Agora, finalmente percebendo o otimismo exagerado das suas "previsões", tenta, de forma nada discreta, um recuo, nem tático nem estratégico, apenas lento o suficiente para não passar (muita) vergonha, mas rápido o bastante para não parecer provocação.
À parte o constrangimento provocado por esse triste espetáculo, o preocupante é a dificuldade do governo em entender o que vem ocorrendo, em particular a vagarosa retomada do crescimento num cenário em que a inflação permanece alta e pressionada.
Essa combinação é o resultado típico de uma economia que enfrenta restrições pelo lado da oferta. Não se trata, é bom deixar claro, dos tais "choques de oferta" aos quais uns tantos ainda atribuem (contra um caminhão de evidências em contrário) a aceleração da inflação.
Essas limitações refletem problemas mais sérios e persistentes, como o esgotamento da disponibilidade de mão de obra, que permitiu a aceleração do crescimento a partir da segunda metade da década passada, bem como o nível reduzido do investimento, em particular em infraestrutura.
Posto de outra forma, o desempenho recente sugere que a capacidade de crescimento sustentável do Brasil é muito inferior àquilo que imaginávamos.
No entanto, se há economistas capazes de entender o problema, não estão no Ministério da Fazenda, que permanece ainda preso à visão que atribui o fraco crescimento à demanda deficiente.
Não por outro motivo as medidas tomadas com o objetivo de acelerar a expansão da economia têm como foco precisamente a demanda, como incentivos ao consumo e uma considerável expansão fiscal, seja pela via da desoneração tributária, seja pelo aumento do gasto federal, com ênfase no gasto corrente.
E, não por outro motivo, fracassaram fragorosamente na tarefa de trazer o crescimento para qualquer nível próximo daquele que o governo havia estabelecido como seu objetivo no começo do mandato.
Sem as uvas do PIB, restam, portanto, as passas do desemprego na lista de realizações governamentais.
Nada mal para quem, como eu, as aprecia, mas aí precisamos saber se a façanha é sustentável, ou se, pelo contrário, acaba gerando novos problemas que inviabilizem sua permanência.
No caso, como tive a oportunidade de argumentar diversas vezes neste espaço, a elevação dos salários por conta do mercado de trabalho apertado, a um ritmo muito acima do crescimento da produtividade, tem sido um dos principais fatores impulsionando a inflação.
Apesar disso, é muito pouco provável que essa questão venha a ser abordada, sobretudo às vésperas da eleição.
Isso dito, a teoria econômica e a experiência histórica sugerem que se trata de uma situação insustentável. Tentativas de manter o desemprego reduzido à custa de inflação alta produzem apenas mais inflação sem ganhos persistentes de emprego.
Cedo ou tarde, mesmo as passas ficarão verdes e não haverá fabulista capaz de escrever uma história convincente sobre o desempenho brasileiro.
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