ESTADÃO - 15/05
O setor sucroenergético voltou às manchetes com as recentes medidas anunciadas pelo governo federal. Alguma atenção tem sido dada também ao setor por causa dos déficits de caixa enfrentados pela Petrobrás, fruto da crescente importação de gasolina. Estamos no início da safra 2013/14 de cana-de-açúcar, momento ideal para se fazer um balanço do que vem pela frente esse ano.
De 2007 a 2012, 41 usinas deixaram de moer cana e produzir açúcar e etanol e mais 12 poderão parar nesta safra. A informação assusta não só leigos no assunto, mas também os analistas mais experientes do setor. Mas é preciso compreender de maneira mais clara esse problema e ver que ele é a consequência de um ciclo que se encerra.
Nas safras 2007/08 e 2008/09, o setor sucroenergético brasileiro operou com rentabilidades negativas em razão dos baixos preços do açúcar e do etanol. E já é de conhecimento geral que a crise financeira mundial, que estourou em setembro de 2008, minou o crédito dos bancos. Naquele momento boa parte do setor vinha com elevadas taxas de endividamento em função de novos investimentos, sobretudo em áreas de cana-de-açúcar e usinas novas. A combinação de margens negativas e escassez de crédito, num setor que vinha sendo custeado por crédito, levou à forte redução da taxa de renovação dos canaviais, elevando sua idade média, e dos tratos culturais. Tudo isso se refletiu nas safras seguintes, com queda da produtividade agrícola e o consequente aumento dos custos relativos.
O setor está voltando a recuperar o fôlego. Após quatro safras marcadas pela produtividade em queda e pouca competitividade do etanol, ele sobreviveu até o ano passado por causa dos preços mais elevados do açúcar. Como se não bastasse, coube ao governo federal tomar decisões que tiraram toda a atratividade para novos investimentos de um setor já bastante combalido, como a redução da mistura de etanol anidro de 25% para 20%, que vigorou entre abril de 2011 e abril de 2013, e a retirada de impostos da gasolina, que beneficiou o consumo do combustível fóssil.
Analisando as usinas que encerraram as atividades, nota-se que a maioria é composta por plantas de pequeno porte, antigas e altamente dependentes do etanol hidratado. E também que várias delas têm como vizinhos grandes grupos que nos últimos anos se tornaram mais fortes com aportes de capital de petrolíferas, tradings e até grandes construtoras. A rigor, o fechamento das usinas que financeiramente não tinham mais alternativas levou a uma transferência de cana-de-açúcar para usinas maiores e mais eficientes, num movimento natural de acomodação e consolidação do mercado.
Mesmo com o fechamento dessas unidades, a área plantada de cana-de-açúcar nunca deixou de crescer (4,8% ao ano de 2007 a 2012). O que, sim, foi ajustado na marra foi a moagem de cana, dada a queda na produtividade - mais de 10% em 2011.
O crédito começou a voltar em 2010 e os grupos mais estruturados puderam reerguer-se e consolidar outros menores. Na safra 2012/13 o setor efetivamente começou a recuperar-se do forte tombo. Linhas de crédito do BNDES para renovação dos canaviais, os elevados preços do açúcar e o mercado norte-americano de etanol aberto estimularam uma recuperação das margens, com melhor produtividade média dos canaviais, e o Brasil voltou a ser grande exportador de etanol. Embora os preços atuais do açúcar não estejam convidativos, 2012 pode ter sido o último ano do ciclo da recente crise do setor sucroenergético.
A volta da mistura de 25% de etanol anidro na gasolina pode soar como medida paliativa. Mas é essencial para elevar a demanda doméstica de etanol em 2 bilhões de litros, equivalentes a 25 milhões de toneladas de cana ou 310 mil hectares, e ainda dá um alívio no caixa da Petrobrás, reduzindo a necessidade de importação de gasolina A. Tal medida também representa um faturamento de R$ 2,43 bilhões a mais para as empresas do setor. Não deixa, no entanto, de ser paliativa porque é insuficiente para recuperar a rentabilidade do setor na safra em início.
Para estimular o etanol hidratado e reduzir as perdas da Petrobrás o governo iniciou, após oito anos, o processo de correção de preços da gasolina ao consumidor. O aumento de 6,6% concedido em fevereiro foi tímido se comparado aos 23% da defasagem internacional registrada no início do ano, mas o setor encarou-o como um bom começo.
O setor ainda carece de maior segurança para voltar a investir. Falta uma definição mais objetiva da participação do etanol na matriz energética do futuro: se ele será um mero carburante misturado à gasolina ou se abastecerá diretamente os motores de ciclo Otto. A novidade, embora tardia, é a isenção integral do PIS/Cofins (R$ 0,12/litro), que poderá auxiliar na retomada da competitividade do etanol hidratado nos principais Estados consumidores. É um alívio, vai dar fôlego à renovação dos canaviais e à expansão dos projetos já construídos, mas é claramente insuficiente para atrair investimentos em novas usinas.
Não são muitas as alternativas para criar as condições necessárias para que um novo ciclo de crescimento ocorra. Todas elas precisam ser pensadas e implementadas nesta safra, uma vez que a moagem de cana já utilizará cerca de 90% da capacidade instalada disponível. A primeira é a adoção de medidas para dar maior transparência à formação de preços da gasolina, tanto na refinaria quanto ao consumidor. Um sistema de mercado livre ou baseado em bandas ou médias móveis seria um grande avanço. A segunda é uma explícita diferenciação tributária entre o etanol e a gasolina, que garanta ao menos a diferença energética entre os dois produtos em favor do biocombustível.
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