REVISTA VEJA
A primeira é do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), o mesmo da emenda constitucional que subordinaria decisões do STF ao Congresso, violando o princípio basilar da separação entre os poderes. Em 2004 ele apresentou projeto de lei ainda mais espantoso, que estabeleceria o "limite máximo de consumo" e a "poupança fraterna".
Pelo projeto, os brasileiros - inclusive os residentes no exterior - e os estrangeiros que aqui vivem somente poderiam consumir dez vezes o valor da renda per capita mensal, perto de 20.000 reais de hoje. O restante, por sete anos, seria compulsoriamente depositado e devolvido nos catorze anos seguintes. Os recursos seriam emprestados a juros de até 50% dos rendimentos dos depósitos e aplicados em díspares finalidades. De onde os depositantes receberiam os outros 50%? Parece que os "empréstimos" não precisariam ser pagos. Como os "projetos sociais relevantes" obteriam lucros para resgatar a dívida?
À gestão da lei caberia a um conselho de trinta pessoas do governo, de centrais sindicais, de entidades empresariais, de organizações religiosas e até de sem-terra. Ricos e pobres teriam acesso ao limite máximo de consumo. Uns pagariam pelos outros. O limite ao consumo evitaria a exaustão dos recursos não renováveis. Para Fonteles, "os ricos devem viver mais simplesmente. Para evitar a previsível catástrofe ecológica para a qual caminha a humanidade". O Brasil lideraria a construção de "um novo mundo, não apenas ecologicamente sustentável, mas também fraterno". Quanta fantasia!
A segunda ideia é do senador Aécio Neves (PSDB-MG). Ele não propõe sandice similar, mas defende uma ideia irrelevante: o fim da reeleição de presidentes, governadores e prefeitos, aprovada em 1998. Para ele, o mandato de quatro anos é pouco para uma gestão minimamente eficiente. E um ano a mais faria muita diferença? Falou-se em desapego ou em mensagem a futuros candidatos de seu partido ao cargo. Aécio não concorreria novamente se virasse presidente em 2014.
A coincidência do mandato presidencial com os do Congresso aconteceria a cada vinte anos. Durante dezesseis anos, o presidente assumiria tendo de articular-se com parlamentares eleitos em momento distinto. Na experiência internacional, os membros do Executivo e do Legislativo costumam ser eleitos ao mesmo tempo. No parlamentarismo a simultaneidade é obrigatória. A lógica está na necessidade de facilitar a conquista de maiorias parlamentares - nas eleições ou em negociações imediatamente posteriores - sem as quais é mais complicado governar e aprovar medidas fundamentais para a economia e a sociedade. Mudanças importantes como a da reeleição - cada vez mais adotada mundo afora — necessitam ser testadas, consolidar-se ou provar-se inconvenientes. Isso requer tempo. Devem ser revogadas apenas quando não se enraizarem, mas nunca para servir de trunfo em campanhas eleitorais ou para tranquilizar grupos de partido.
Nenhuma instituição política é perfeita, mas a regra da reeleição merece ser preservada por mais tempo. Por ora, tem mais vantagens do que desvantagens. Equivale a um mandato de oito anos com um julgamento dos eleitores no meio do período. Se bem-sucedido, o governante deve ser mantido. E substituído em caso contrário. Dificilmente a ideia de Aécio triunfará. Como ele próprio reconhece, interesses políticos de governadores e prefeitos - dir-se-á também de futuros candidatos a esses cargos - tendem a bloquear o projeto. Em resumo, além de inconveniente, a proposta é politicamente inviável. Não é, decerto, uma ideia genial. Consegue, mesmo assim, não ser tão esdrúxula quanto a da poupança fraterna.
O exotismo e o casuísmo dessas duas propostas não contribuem para construir uma imagem positiva do Congresso. Melhor seria que os parlamentares se mobilizassem em favor de uma agenda relevante para o futuro do país.
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