ESTADÃO - 20/05
A Polícia Federal executou imensa operação no Rio Grande do Sul, prendendo o atual e o ex-secretário estadual do Meio Ambiente, o secretário municipal do Meio Ambiente da capital, além de funcionários de órgãos ambientais, entre eles um dirigente, vários empresários e "despachantes ambientais". Como sempre, a operação foi montada para produzir muito estardalhaço, embora até agora as provas tenham sido escassas - ainda não dá para ver com precisão se os supostamente envolvidos são efetivamente culpados.
Os elementos mais probatórios parecem ser os de licenças de mineração, particularmente de areia, a cargo do governo estadual. No que concerne a Porto Alegre, o que veio a público até o momento parece indicar a ausência de corrupção ou atos ilícitos, apesar de o secretário ter amargado, com os outros secretários, cinco dias no Presídio Central. O castigo veio antes do suposto crime.
Interessa aqui, contudo, não somente o caso particular do Estado ou da capital, como também seu significado nacional, na medida em que as questões de licenças ambientais impactam, por exemplo, diretamente a construção civil e os shopping centers. Empresários desses ramos são submetidos a uma verdadeira via-crúcis para a obtenção de licenças ambientais e viárias para seus empreendimentos. Diante de dificuldades de tal monta, não deveria surpreender o aparecimento de vendedores de facilidades.
Um ponto que merece especial destaque é o fato de os empresários terem sido imediatamente acusados de corruptores. Houve um nítido viés antiempresarial, como se o lucro fosse um ilícito potencial e o privado, algo de certa maneira nocivo por princípio. Nesse sentido, a iniciativa privada é tomada por responsável pelos supostos crimes, como se a inclinação ao "crime" fosse própria de sua natureza. Aliás, algumas das incriminações são simplesmente ridículas, como o fato de o funcionário público X ter tirado da fila determinado processo a pedido do empresário Y, de modo que pudesse ser analisado com prioridade. Qual o crime nisso?
Note-se que esses processos se encontram em filas intermináveis, que se arrastam por vários anos - um processo que leve um ou dois anos é considerado rápido, pois outros podem tardar de quatro a seis, talvez mais. A pergunta que cabe é a seguinte: que negócio pode aguardar tanto tempo por uma licença? Anormal seria que os empresários não tentassem acelerar os processos de licenciamento, por uma razão muito clara: o prejuízo daí resultante.
Isso não significa, evidentemente, que as regras não devam ser seguidas. Acontece que as regras e seus procedimentos são formulados como se visassem à criação de um sem-número de obstáculos, como se empreender fosse uma atividade que, de certo modo, deveria ser punida.
A situação é kafkiana, com empresários perdidos nos labirintos burocráticos. Para um processo andar, só com contatos nos órgãos ambientais e em outros departamentos, porque por si mesmos não tendem a caminhar. O "despachante ambiental" torna-se, assim, uma figura necessária, pois, em sentido estrito, os processos não andam. Se existem "despachantes ambientais" e imobiliários, isso se deve à própria natureza do processo. Brotam lá onde as dificuldades florescem.
As regras de licenciamento ambiental e de construção em geral são elaboradas de forma a não facilitar a vida dos interessados, seja para um edifício, um shopping ou a simples reforma de uma casa. Desaparece a ideia do servidor público, cuja função deveria ser precisamente servir ao cidadão, que paga impostos e, desse modo, paga os salários de toda a máquina estatal. Muitos municípios estão justamente procurando resgatar essa ideia, orientando, inclusive, a atual administração da cidade de Porto Alegre.
Foi noticiado que mais de 60% dos atuais processos ambientais no governo estadual nem sequer foram analisados. Ou seja, a maioria está literalmente parada. A ineficiência burocrática é de tal ordem que as pessoas envolvidas terminam utilizando os mais diferentes recursos para que suas demandas possam ser analisadas.
Note-se que a ineficiência burocrática pode bem significar, no que parece ser o caso estadual, a ausência de meios - por exemplo, um número muito pequeno de computadores em relação à quantidade de funcionários. Equipar Secretarias de Meio Ambiente - quiçá até com doações privadas - é uma necessidade incontornável.
A corrupção, quando ocorre, é fruto de um certo tipo de regras, de burocracia e de meios. Quando tudo é feito para dificultar os projetos empresariais e particulares, surgem os mais diferentes tipos de "oportunidades". Fosse outra a situação, as oportunidades não surgiriam e os vendedores de facilidades não teriam a quem oferecer os seus serviços.
Seria muito simples resolver o problema da corrupção na burocracia pública, e na ambiental em particular. As compensações viárias, por sua vez, não poderiam ser de um montante que tornasse o empreendimento inviável ou pouco atrativo. Um limite deveria ser estabelecido.
Bastaria, no geral, que as regras ambientais fossem claras, precisas e transparentes. Os processos, seguindo regras exequíveis, seriam encaminhados por meio eletrônico e respondidos também eletronicamente. Cada parte se responsabilizando por suas ações, conforme as competências respectivas.
Em caso de resposta negativa, as razões deveriam ser claramente formuladas, para que outro encaminhamento fosse possível, na observância das leis. Mais importante ainda, a burocracia teria um prazo máximo e breve de resposta, com os funcionários e departamentos envolvidos sendo responsabilizados, até juridicamente se for o caso, por seu não cumprimento. Sem prazos curtos que sejam obedecidos, abrem-se as portas para a corrupção.
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