O GLOBO - 18/05
Na mais longa deliberação parlamentar dos últimos tempos, criaram-se condições para a modernização de um elo-chave da infraestrutura
Apesar de todos os percalços, da ação feroz de lobbies e da falta de coordenação política da base por parte do governo — base que se esfacela quando estão em jogo interesses de grupos e corporações —, aprovou-se um conjunto de normas capazes de abrir um novo ciclo de modernização num elo estratégico da precária infraestrutura brasileira.
Mas que necessitarão de um esmerilhamento por parte do Planalto, talvez por meio de vetos e/ou regulamentações, para que se restaure na integralidade o espírito da MP original, destinada a dar um choque de eficiência no setor, pelo estímulo à concorrência entre terminais, via ruptura de cartórios de empresários e sindicatos, e mais investimentos. Deverá levar algum tempo a decantação de tudo o que foi aprovado, em meio a uma guerra de emendas e contraemendas, para se ter um mapa real da nova regulação portuária, a fim de que o Planalto decida com segurança o que fazer em alguns pontos alterados na Câmara.
Um dele é a renovação de contratos de exploração de áreas em portos públicos, assinados com grupos privados depois da lei de 1993. A versão original da MP 595 revogava os contratos, para se fazer novas licitações. O governo perdeu para lobbies na Câmara, e passou a haver a possibilidade de prorrogá-los, segundo emenda inspirada pelo próprio Planalto, consta que para apressar a votação.
Para não contrariar o espírito desta nova abertura dos portos, o ideal é não haver renovações automáticas, a fim de serem atraídos novos grupos e haver margem para se exigir maior eficiência. A presidente Dilma terá até 5 de junho para decidir.
O saldo da guerra é bastante positivo. As 39 horas de debates consumidas na Câmara e no Senado, em três dias, são tempo recorde de deliberação no Legislativo sobre um tema, pelo menos desde a rejeição da Emenda das Diretas, de Dante Oliveira, em abril de 1984, depois de 15 horas de embate parlamentar.
A modernização nas regras portuárias se equipara a reformas liberalizantes empreendidas na Era FH. Vai no mesmo sentido a permissão para a exploração de portos por empresas que não tenham carga própria. Elas poderão competir com outros terminais em qualidade de serviço e tarifas. E não estão obrigadas a contratar estiva por meio do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo), entidade criada na legislação de 1993 para conciliar os interesses de empresas concessionárias e sindicatos. Em relação ao que existia antes foi um avanço. Mas terminou superado pelas necessidades de ganhos de produtividade da economia brasileira.
A existência desses portos livres servirá de pressão para que os terminais públicos, onde continuarão a existir Ogmos, se tornem mais eficientes.
Criadas as condições para se desobstruir gargalos nos portos, é preciso enfrentar com o mesmo vigor o nó das rodovias e ferrovias. Portos mais modernos pouco poderão ajudar no aumento da competitividade do país se não estiverem ligados a uma infraestrutura robusta.
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