Ontem, tentava-se ainda consertar a declaração do presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem. O ministro holandês provocou a queda das ações de bancos espanhóis, italianos e até franceses ao dizer que o caso de Chipre seria o modelo. Deu medo nos aplicadores, e com razão. Depois, garantiram que é um caso à parte, mas a Eslovênia começou a afundar da mesma maneira.
Os depósitos até € 100 mil são protegidos por lei europeia. A cifra garante os que têm menos, mas atinge a classe média. Sendo feito dentro de uma reestruturação bancária, o confisco não precisa de aprovação dos parlamentos e isso quer dizer que a qualquer momento outros países podem baixar a medida. Para efeito de comparação, se esse confisco fosse aplicado no Brasil, quem tivesse R$ 260 mil em conta perderia entre 30% e 40% disso da noite para o dia. Poderia ficar até R$ 104 mil mais pobre. Não é difícil imaginar a dúvida que paira sobre a cabeça de gregos, portugueses, espanhóis, irlandeses e italianos. Eles olharão de forma diferente para os seus extratos bancários. A quebra de confiança e ameaça de saques colocam novamente em risco a solvência do cambaleante sistema financeiro europeu.
- Se eu fosse europeu, e tivesse dinheiro em conta acima desse corte, estaria cogitando sacar as economias para deixar apenas € 99,99 mil. Se as pessoas fizerem isso, os bancos terão problemas - disse a economista Monica de Bolle, da consultoria Galanto.
O termo técnico é taxação sobre depósitos, mas, na prática, o que houve foi confisco. Dentro de um processo de reestruturação bancária, estabeleceu-se um valor que não pode ser resgatado nas contas acima de € 100 mil. Se fosse imposto, como pensou-se inicialmente, tinha que passar pelo parlamento. Para Monica de Bolle, o controle de capitais sobre o Chipre significa que o país está dentro de uma união monetária, mas seu dinheiro tem menos liberdade que o de outros países. Virou um caso à parte na zona do euro:
- O capital que está dentro do Chipre, agora, é diferente do que está na Alemanha, Grécia, Portugal. São euros diferentes. O euro do Chipre é uma moeda que não é conversível porque sofre controle de capitais. Isso coloca o país com um pé dentro da zona do euro e outro fora.
O segundo maior banco do país, o Laiki, foi fechado, com a separação dos ativos podres dos bons. Os ativos bons serão incorporados ao Banco do Chipre, o maior do país, e os ruins, liquidados. E o primeiro, cujo presidente está se demitindo, o Banco do Chipre, só não foi fechado para não desorganizar mais a economia. Os bancos ainda não passaram pelo teste de fogo que será reabrir após ficarem mais de uma semana fechados.
A pergunta mais difícil de responder é: por que a Europa resolveu quebrar o pilar de sustentação dos bancos - a confiança - em troca de um resgate de € 10 bi, menos de 10% do que foi gasto com a Grécia? O que mais se diz é que a chanceler Angela Merkel tem eleições em setembro e não quer desagradar seu eleitor com mais um resgate. Principalmente ao Chipre, uma pequena ilha, paraíso fiscal, com fortes relações com a Rússia. Mas a explicação parece insuficiente.
De qualquer maneira, a crise no Chipre está destinada a ficar na história econômica como um dos momentos de maior imperícia das autoridades.
A crise da Grécia atormentou o mundo e foi controlada com dificuldade. Agora, é o Chipre que está no centro da dúvida sobre o futuro da moeda comum. Tudo o que havia sido superado começa a ser rediscutido. Nunca tantos erraram tanto em tão pouco tempo.
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