Duas das medidas que o governo anunciou no ano passado, mas que só entraram em vigor agora, podem ter contribuído para segurar os investimentos das empresas nos últimos meses. Uma delas foi a redução da tarifa de energia, que no caso dos consumidores industriais entrou em vigor no dia 1º deste mês e foi de até 32%. A outra foi a desoneração da folha de pessoal, estendida, neste ano, para 27 setores econômicos, totalizando 42.
A presidente Dilma Rousseff anunciou o corte de energia em setembro, mas, como a decisão dependia de aprovação legal, só começou a vigorar neste mês. O mesmo ocorreu com a desoneração de folha. Sabendo desses dois estímulos e não tendo mais condições de queimar estoques, uma vez que esses já foram em boa medida ajustados, muitas indústrias podem ter optado por não produzir ao custo de uma energia mais cara e de uma despesa previdenciária maior.
Essa é uma hipótese razoável para o fato de o investimento não ter decolado no segundo semestre de 2012. Há, claro, outras incertezas concorrendo para um ambiente de maior cautela por parte dos empresários. Uma delas são as mudanças operadas, com idas e vindas, no aparato macroeconômico que rege o país desde 1999. Outra diz respeito a regras adotadas pelo governo para o investimento privado em setores de infraestrutura.
Corte de tarifa de luz e desoneração podem ter adiado investimentos
O governo tomou a decisão correta ao resolver que cabe à iniciativa privada a liderança dos investimentos em setores de infraestrutura (rodovias, ferrovias, portos e aeroportos). Trata-se de uma deliberação histórica. É o reconhecimento de que o Estado não tem condições de assegurar os investimentos necessários à eliminação de gargalos nesses setores.
Lembre-se que, com todo o seu pragmatismo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não ousou privatizar sequer um aeroporto. Temia a reação dos sindicatos e, por consequência, de sua antiga base social. Mesmo o presidente Fernando Henrique Cardoso, realizador de importantes reformas econômicas - entre elas, o fim de monopólios estatais em áreas como PETRÓLEO e telecomunicação -, não avançou muito no que diz respeito à transferência da gestão da infraestrutura ao setor privado.
Do alto de sua elevada popularidade, a presidente Dilma tomou a decisão de avançar nesse tema e, registre-se, com a oposição velada de amplos setores do PT, alguns devidamente representados no governo. Por saber da importância desse movimento, Dilma teme o seu fracasso, que jogaria por terra uma oportunidade histórica: a modernização da infraestrutura do país, sob a liderança do setor privado e com o apoio tácito da esquerda (o PT).
Essa bandeira pertence, historicamente, à oposição. Se Dilma fracassar, mesmo PSDB e DEM, na hipótese de retornarem ao poder, terão dificuldade de implementá-la, inclusive porque o PT a contestará.
O problema está nos detalhes. O debate interno no governo para a modelagem das medidas liberalizantes é tão acirrado que, muitas vezes, vence a opinião daqueles que defendem mais Estado e menos setor privado nos serviços públicos. É isso o que explica o fato de o governo ter sido obrigado a suspender o leilão de duas rodovias federais (BR-116 e BR-40). As condições para o negócio geraram desinteresse entre as empresas - ontem, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou, em São Paulo, regras mais favoráveis.
Um integrante da equipe econômica sustenta, a partir desse exemplo, que o governo está disposto a ajustar os parâmetros dos leilões públicos e, assim, atrair o setor privado para as concessões. "Os parâmetros vão se ajustando. O governo pesa a mão ali, depois mostra que vai ter menos demanda, vai ter menos interesse e as coisas vão se ajustando", diz essa fonte. "Uma coisa é a decisão estrutural, que é ter um movimento maior do setor privado, com mobilização da poupança privada e também de recursos externos [daí, a realização de "road-shows" no exterior para atrair investidores]. O problema dos parâmetros é conjuntural. Eles são ajustáveis."
A equipe econômica acredita que, à medida que as incertezas vão sendo removidas, os empresários voltam a investir. É algo ainda a ser comprovado.
De qualquer forma, a ênfase nas iniciativas de redução do custo de produção e de ampliação da infraestrutura não é gratuita. A economia brasileira vive momento curioso e, ao mesmo tempo, desafiador. Os fundamentos são bons, o custo de capital nunca foi tão baixo, a taxa de câmbio está menos apreciada, o desemprego é o menor da série histórica apurada pelo IBGE, a demanda continua crescendo a uma velocidade razoável, o investimento estrangeiro direto (IED) é recorde (segundo a UNCTAD, o Brasil foi o terceiro destino de IED em 2012, atrás apenas de China/Hong Kong e Estados Unidos), mas o Produto Interno Bruto (PIB) está entrando no terceiro ano consecutivo de baixo crescimento.
Uma das possíveis explicações para esse desempenho é a queda da produtividade da economia. No caso do trabalho, as empresas estariam usando menos intensamente o fator trabalho - na expectativa de que a economia vá se recuperar adiante, elas estariam mantendo seus funcionários, apesar do PIB e lucros fracos, porque recontratar custa caro; para compensar o baixo desempenho, estariam diminuindo o número de horas trabalhadas.
Por causa da reduzida taxa de desemprego, a demanda tende a continuar forte nos próximos meses (alta de 8% ao ano, segundo expectativa do governo). No setor industrial, há uma folga razoável na utilização da capacidade instalada que também pode ser preenchida. O fator trabalho, por sua vez, pode ser mais intensamente usado pelas empresas. A limitação desse cenário é a baixa produtividade do trabalho e da economia como um todo.
Não se muda a produtividade do trabalho da noite para o dia e, nesse aspecto, Brasil tem sido historicamente negligente. Para melhorar a equação, resta estimular os investimentos privados. "Dá para melhorar a produtividade da economia adotando medidas como a melhora da infraestrutura, a redução do custo de produção, o aumento do retorno do capital, a redução do custo de energia. Energia é imediato, os outros levam mais tempo, mas alguém tinha que começar", diz um auxiliar da presidente Dilma. "O longo prazo começa agora."
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