FOLHA DE SP - 12/02
A totalidade da expansão do mercado interno está sendo atendida por importações, visto que cai a produção
Comento duas notícias, uma boa e outra ruim. Em plena terça-feira gorda de Carnaval, nem é preciso perguntar qual delas devo abordar primeiro. É a boa, naturalmente.
O país vive um momento de pleno emprego. A última estatística nessa área mostra que o índice de desemprego era de 4,6% em dezembro, um mês em que as ofertas de trabalho são naturalmente elevadas em razão das vendas de fim de ano. Na média de 2012, a taxa ficou em 5,5%, a menor da economia brasileira desde 2003.
Talvez esse desempenho não tenha precedente na história econômica do país, mas isso é impossível saber porque o sistema de cálculo mudou em 2003 -por isso, costuma-se dizer que é o menor desde que começou a atual série histórica.
Para ter uma ideia da importância desse resultado, basta observar que os países da União Europeia terminaram 2012 com uma taxa de 11,7%, sendo a Espanha um dos países mais atingidos, com 26%. Nos Estados Unidos, a taxa subiu para 7,9% em janeiro.
O pleno emprego tem um efeito imediato na economia: aumento da renda. Entre os assalariados brasileiros, a renda média era de R$ 1.805 por mês em dezembro. Na média de 2012, a renda das pessoas empregadas aumentou 4,1% na comparação com 2011. Além do baixo desemprego, a elevação da renda foi consequência do reajuste generoso do salário mínimo em 2012, de 14%.
Há várias razões que explicam por que o emprego continua crescendo ao mesmo tempo em que a produção esfria, principalmente no setor industrial, que registrou em 2012 um de seus piores desempenhos desde 1992, com uma retração de 2,7%. A principal razão, porém, na minha avaliação, é que os empregadores acreditam na breve recuperação da atividade e não se arriscam a dispensar sua mão de obra qualificada, mesmo que ela não esteja 100% ocupada.
Passemos então à notícia ruim. Mais do que ruim, ela é preocupante e certamente a ela não foi dada a atenção necessária. A balança comercial brasileira fechou janeiro com um deficit de US$ 4,04 bilhões, o maior da série histórica de 20 anos. Há uma justificativa para esse número tão negativo. Dentro dessa conta está US$ 1,6 bilhão correspondente a importações de combustíveis do ano passado que só agora foram contabilizadas. Ou seja, se isso não tivesse ocorrido, o deficit seria de US$ 2,4 bilhões, ainda assim um valor altamente preocupante.
Esse número, mesmo com as ressalvas do efeito Petrobras, é o reflexo da perda de fatias do mercado interno para produtos importados em quase todos os setores manufatureiros. A totalidade da expansão do mercado interno está sendo atendida por importações, visto que cai a produção manufatureira e crescem as vendas do comércio.
Além do estrago que isso faz na indústria brasileira, é preciso colocar atenção no efeito que poderá ter, no médio prazo, nas contas externas. Em 2011, o superavit comercial brasileiro atingiu US$ 29,8 bilhões. Em 2012, US$ 19,4 bilhões. Nos 12 meses até janeiro, esse valor já caiu para US$ 16 bilhões. Para 2013, os otimistas esperam no máximo
US$ 10 bilhões. Ou seja, há uma clara tendência de redução do superavit e a hipótese de deficit neste ano não está mais descartada.
Pela confortável situação das contas externas, com reservas de US$ 370 bilhões, não há por que temer convulsões cambiais no curto prazo. Além das reservas, o país conta com alta credibilidade internacional, o que mantém um fluxo importante de investimento estrangeiro direto e de aplicações financeiras. Mas nunca é demais lembrar a velha frase de Mario Henrique Simonsen: "A inflação aleija, mas o câmbio mata".
Preocupa o fato de que a taxa de câmbio voltou a ser usada, ainda que de forma discreta, para ajudar no controle da inflação. O real valorizado retira competitividade da indústria local e reduz o preço dos produtos importados. Com isso, avança o processo de desindustrialização, que já é um fato.
Há muita margem de manobra para o câmbio, para controlar a inflação e para estimular a produção interna sem a necessidade de medidas heroicas. Até porque o país opera com pleno emprego e renda em alta, como vimos acima. Mas é preciso ter cuidado com manobras bruscas, que possam levar aqueles que acreditam na breve recuperação da economia e mantêm empregos a desconfiar da própria crença.
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