sábado, fevereiro 23, 2013

É o consumo, idiota - CELSO MING

O ESTADO DE S. PAULO - 23/02


Uma inflação alta demais e a rápida deterioração das contas externas são manifestações do mesmo fenômeno: consumo elevado demais, não acompanhado por aumento proporcional da produção interna.

A inflação tem tudo para se manter acima de 6% ao ano nos próximos meses. O governo Dilma assegura que, no segundo semestre, esse número ruim será revertido. No entanto, não está claro como e se isso acontecerá de fato. Por enquanto, o governo espera uma virada mais ou menos espontânea. Há razões para acreditar em que, também nesse caso, somente boas intenções não bastarão, como ficará mais bem exposto na próxima Coluna.

A piora das contas externas ficou demonstrada pelo aumento recorde do rombo nas Contas Correntes.

(Apenas para refrescar a memória, Contas Correntes ou Transações Correntes é o fluxo de pagamentos e recebimentos com o exterior em mercadorias, serviços e transferências, que é aquele dinheiro que as famílias mandam ou recebem de quem trabalha ou estuda lá fora. Excluem os fluxos de capital em empréstimos e investimentos.)

O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Túlio Maciel, apressou-se em explicar que as contas externas de janeiro vieram inchadas demais porque parte das importações de dezembro, especialmente de combustíveis, foi descarregada no mês seguinte, por decisões burocráticas que tiveram cheiro de embelezamento dos números de 2012. Esse efeito estatístico tem menos importância. O fato relevante é que as importações medidas em 12 meses (até janeiro) dispararam 14,6%, enquanto as exportações caíram 1,1%.

Refletem elevação do consumo interno (de mais de 8% em 12 meses) que a oferta interna não tem sido capaz de acompanhar. Daí esse forte aumento do suprimento externo.

A surrada tese de que o mau desempenho do comércio com o resto do mundo é consequência "do câmbio fora de lugar" não consegue convencer. Entre março e dezembro de 2012, o câmbio proporcionou desvalorização do real (alta do dólar) de 20%, sem que o ajuste tenha se refletido no resultado.

Esse diagnóstico não é da oposição ao governo, é do Banco Central. Na última Ata do Copom, a autoridade monetária advertiu que o baixo crescimento econômico do País não é desdobramento da falta de demanda (ao contrário, está aquecida demais), mas da insuficiência da oferta. Essa, por sua vez, é o resultado da falta de investimentos e do elevado custo de produção, que vem tirando competitividade da indústria.

Por enquanto, o rombo nas Contas Correntes continua sendo generosamente compensado com a entrada de Investimentos Estrangeiros Diretos (IED). Mas, mesmo sobre esse item, começam a piscar luzes amarelas. Os números de janeiro (entrada líquida de US$ 3,7 bilhões) ficou aquém do esperado. Ainda é cedo para dizer que a deterioração da percepção que os analistas internacionais têm sobre o Brasil prejudica os IEDs. Mas é bom ficar de olho.

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