sexta-feira, novembro 16, 2012

Justiça tributária - EDITORIAL O GLOBO


O Globo - 16/11


Para manter em funcionamento a máquina administrativa, o poder público conta com algumas fontes de receita. São elas que abastecem o caixa de onde saem os recursos com os quais os governos fazem investimentos (infraestrutura, urbanismo etc.), provêm as dotações orçamentárias das diversas pastas (Educação, Saúde, Transportes, entre outras), pagam a folha de pessoal etc. 

Nos municípios, as receitas resultantes da cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano são vitais para a saúde financeira das prefeituras. Não se entende, portanto, que na segunda maior cidade do país, Rio de Janeiro, os governos que a administraram nos últimos 12 anos tenham tratado com tão pouco apreço o recolhimento dessas obrigações. A lei que rege o IPTU carioca é um monstrengo aprovado de afogadilho em 1999, quando a Câmara Municipal, premida por prazos que, se não cumpridos, inviabilizariam a cobrança do imposto no ano seguinte, não perdeu a chance de contrabandear para a legislação uma série de absurdos.

Diversas emendas consagraram um festival de isenções, de tal maneira que, com elas, os vereadores beneficiaram um milhão de contribuintes, de uma malha até então registrada de 1,8 milhão de imóveis. Desde então, o Rio recolhe o IPTU de apenas 40% das residências, 8,7% dos terrenos e metade das salas comerciais. São números condenados por qualquer manual de administração pública - e que se agravam quando se sabe que neles não está embutida sequer a parte urbanizada das favelas, que ocupam a terça parte do território da cidade.

Há uma grave distorção num sistema que alija de cobrança boa parte dos imóveis da cidade. E nem se pode dizer que se trata de opção demagógica de isentar proprietários de baixa renda: em Copacabana, por exemplo, 35% dos apartamentos estão fora do IPTU.

Reformar o sistema de cobrança do imposto não é necessariamente uma maldade contra o contribuinte. No caso do Rio, é uma imperiosidade para a saúde financeira da cidade. Mas isso não implica fazê-lo pela ortodoxa fórmula de simplesmente avançar no bolso do cidadão, aumentando alíquotas, com a justificativa de uma valorização patrimonial que não aumenta a renda disponível do proprietário. Numa cidade em que pelo menos 60% dos proprietários de imóveis estão desobrigados de recolher o IPTU, aumentar o imposto sem critérios punirá duplamente aqueles que já o pagam.

Corrigir o imposto é uma opção correta da prefeitura, desde que o faça sob a ótica da justiça tributária. Para isso, é preciso ampliar a base de contribuintes, o que aumentaria automaticamente a arrecadação e, a depender de vontade política, permitiria reduzir o valor das atuais alíquotas. A prefeitura, que discute a reforma do seu sistema tributário, já lançou algumas ideias do que pretende fazer, mas só baterá o martelo em 2013. Há tempo, portanto, para estudar meios de ampliar a distribuição de carnês do IPTU sem necessariamente sobrecarregar o orçamento dos donos de imóveis já taxados.

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