sexta-feira, novembro 23, 2012

A pena de Cachoeira - LUIZ GARCIA


O Globo - 23/11


Não é muito fácil entender a lógica do sistema penal brasileiro no que se refere ao regime definido como semiaberto.

Um cidadão ingênuo pode até mesmo declarar-se perplexo: ele entende que algo possa estar ou aberto ou fechado.

Uma porta ou uma garrafa, por exemplo, podem estar abertas ou fechadas. Mas como imaginá-las um pouco abertas ou um tanto fechadas?

É tão estranho, por exemplo, como considerar que uma pessoa seja, digamos, semivirgem. Sei que, em certas sociedades, em continentes distantes, a semivirgindade é vista como um status inteiramente natural - coisa de países estrangeiros com costumes e normas que não precisamos entender ou aceitar.

Mas o que está aqui em questão é o nosso sistema penal semiaberto. Principalmente porque ele não funciona como deveria: o Ministério da Justiça confessa que existem mais de 70 mil cidadãos condenados nesse regime - mas só existem vagas nas penitenciárias para menos de 50 mil.

Os semicondenados são cidadãos que receberam penas de menos de oito anos de detenção. Ou seja, não são considerados perigosos. E, no sistema semiaberto, poderiam aprender profissões honestas que os afastariam da vida criminosa.

Em tese, é certamente uma boa ideia. Mas parte do princípio de que os condenados beneficiados pelo sistema estarão treinados em profissões honestas que os afastarão definitivamente da vida criminosa.

Para a grande maioria, isso certamente pode acontecer. Mas, falando sério: alguém acredita que o bicheiro milionário Carlinhos Cachoeira, condenado a cinco anos de prisão por formação de quadrilha e tráfico de influência, aproveitará o regime semiaberto para aprender uma profissão decente?

Não é falta de confiança na estrutura penal imaginar que, em algum tempo, Cachoeira encontrará meios de driblar o sistema - que, é preciso reconhecer, não foi criado para condenados cheios de dinheiro como ele.

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