FOLHA DE SP - 02/10
SÃO PAULO - A Venezuela é uma democracia? Eu me inclino a responder que sim. Ela, afinal, passa em dois testes fundamentais. No próximo domingo, o país vai às urnas para escolher de forma razoavelmente livre seu próximo dirigente. Além disso, apesar das tendências autoritárias de Hugo Chávez, existe liberdade de imprensa e não há denúncias de perseguições sistemáticas e violentas a opositores.
A pergunta seguinte é mais difícil de responder: isso basta? Aqui, minha tendência é dizer não. Já comentei neste espaço o importante livro "Why Nations Fail", de Daron Acemoglu e James Robinson. A tese central dos autores, que eles justificam com profusão de dados históricos e análises, é a de que, no longo prazo, países só funcionam quando contam com instituições que promovem o poder político dos cidadãos e lhes permitem tirar proveito das oportunidades econômicas.
Nesse quesito, a situação da Venezuela é ainda mais paradoxal. Como mostrou Clóvis Rossi anteontem, Chávez, ao longo dos 14 anos em que está no poder, logrou a façanha de fazer com que 2,1 milhões de venezuelanos (pouco mais de 10% do eleitorado) deixassem de ser oficialmente pobres. Ou seja, houve uma partilha mais justa dos recursos econômicos.
Mas, se Acemoglu e Robinson estão corretos -e eu acho que estão-, o avanço não é sustentável, porque não se fez acompanhar de nada semelhante no nível das instituições políticas. Ao contrário, Chávez as remodelou de forma a servir a seus objetivos imediatistas, que incluíam, na melhor tradição populista, distribuir renda para obter apoio eleitoral.
Uma prosperidade duradoura, porém, depende de um fluxo de inovações e ganhos de produtividade que dificilmente é compatível com um regime personalista no qual todos os interesses se subordinam à agenda presidencial. Se Chávez fez bem a muitos venezuelanos, também fez muito mal à Venezuela.
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