CORREIO BRAZILIENSE - 04/09
“Não aposte jamais em brigas entre Lula e Dilma. Ela é sincera e, quando gosta de alguém, protege”. Ouvi essa frase de Carlos Araújo, ex-marido de Dilma, quando ela era candidata a presidente da República, em 2010. Ontem, foi um desses dias em que a frase de Carlos Araújo tomou vida. A forma como Dilma respondeu ao artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, numa firme defesa da herança que recebeu de seu antecessor e padrinho político, soou como um alerta a todos que tentam afastá-la de Lula. E também marca o que vem por aí, dentro da estratégia petista de tentar ressaltar os aspectos positivos do governo ex-presidente como contraponto ao que está todos os dias nos jornais e na tevê a respeito do julgamento do mensalão.
Pra quem não leu o artigo de Fernando Henrique Cardoso, publicado nos jornais de domingo, vale lembrar que o ex-presidente se referiu ao governo Lula como uma herança maldita recebida por Dilma. Ele citou a queda de ministros em série e a troca de comando na Petrobras, decidida pela atual presidente da República, como exemplos de que a administração de Lula não foi lá essas coisas. A resposta de Dilma veio logo. Começou a ser definida ainda no domingo, no Alvorada.
Em, menos de 200 palavras, ela citou o que considera os aspectos positivos do governo Lula, mencionou o crescimento do período, a economia “robusta”, as reservas cambiais recordes e a inclusão de 40 milhões de brasileiros no mercado de consumo (A íntegra está disponível na internet em vários sites, inclusive no blog que mantenho no www.correiobraziliense.com.br). Sinceramente, Fernando Henrique deve ter sentido até uma pontinha de inveja por não ter tido um candidato do PSDB que defendesse seu legado nas três últimas eleições como Dilma defendeu o de Lula. (Aliás, vale lembrar, foi a própria Dilma quem ajudou no resgaste da gestão de Fernando Henrique Cardoso, quando enviou ao ex-presidente tucano uma carta pelos 80 anos e fez questão de convidá-lo para o almoço de recepção ao presidente Barack Obama, logo no início do governo. Lula, por sinal, não gostou e nem sequer apareceu ao evento no Itamaraty).
Por falar em legado…
Não dá para esquecer também que Dilma fez parte do governo que recebeu. Portanto, se houve erros administrativos, ela pode ter sido corresponsável por eles. Mas a carta de ontem vai além de querer defender a própria pele. Quando ministra, Dilma foi o que restou a Lula como candidata quando sucumbiram os principais nomes cogitados dentro do PT para sucedê-lo. Uns caíram pelo mensalão, outros por motivos diferentes, também nada nobres. Agora, entre os petistas, há quem considere que, mais uma vez, sobrou apenas a presidente. Com a antiga cúpula do PT— aquela que ajudou Lula a ascender ao poder — respondendo no Supremo Tribunal Federal por formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, peculato, corrupção e por aí vai, Dilma é o que o ex-presidente tem hoje de mais contundente para ressaltar os aspectos positivos de sua administração e defendê-lo. Por isso, a nota oficial de ontem.
A missão de Dilma nesse doloroso processo mensaleiro pelo qual passa o PT é delimitar os campos em relação ao futuro. Como uma empresa separa ativos e passivos quando é colocada à venda, Dilma hoje separa a parte boa do governo Lula — os avanços sociais e econômicos do período — da parte que o PT adoraria esquecer: o mensalão. Nesse sentido, como ela não teve relação com o episódio que desaguou na Ação Penal 470, cabe a ela vender a parte boa ao eleitor e delimitar ainda os terrenos no que se refere aos demais partidos. Por isso, daqui por diante, ela não hesitará em deixar claro de que lado ela está hoje e estará sempre. Ela é parte da história do governo Lula e dissociá-la dos erros e acertos da administração, especialmente, no setor de energia, o qual ela comandou, não funciona. E a cada dia que passar, nós veremos que os laços entre Dilma e Lula não são frágeis. Ela, como bem me disse Carlos Araújo, não só gosta de Lula, como o protege.
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