quinta-feira, agosto 02, 2012

Inércia lá fora irrita e cansa - ALBERTO TAMER


O Estado de S.Paulo - 02/08


Enquanto as atenções se voltam para a Olimpíada, para ver quem corre mais, nada mais ou pula mais, aprimorando, assim, a "humanidade" - não sei por que não há competição de xadrez para jovens inteligentes - os bancos centrais dos Estados Unidos e da Europa esquentam os músculos. A economia mundial desacelera, ressurgem os riscos de recessão e deflação, o desemprego só aumenta, mas Ben Bernanke não se decide ainda sobre que fazer. O Fed reuniu-se ontem e disse de novo, como há meses, que está atento para agir - mas ainda vai esperar quando setembro vier.

O Banco Central Europeu reúne-se hoje, sob o tom de ameaça do seu presidente, que agora vai agir e tem força para tanto. Pode reduzir o juros, dar mais financiamento para os bancos, comprar títulos da Espanha, da Itália, mas enfrenta a oposição da Alemanha. É um voto só, mas pesa muito.

Também aqui a situação se deteriora e o FMI alerta para a depressão em alguns países do bloco que pode contaminar os outros. Bernanke já admitiu que a crise que já dura três anos está afetando a economia americana, mas hesita ainda em emitir mais dólares para compra de títulos do Tesouro, mesmo com a inflação sob controle.

Sem inflação. Ela só aumenta se os preços do petróleo registrarem uma grande alta, o que não ocorreu até agora, apesar do bloqueio das exportações do Irã - o país dos Aiatolás enfurecidos que querem construir sua bomba atômica para arrasar Israel e realizar o sonho de Hitler, de destruir o povo judeu.

Há reservas nos países consumidores, os Estados Unidos e a China, e acima de tudo a Arábia Saudita, que não só ajuda contra a luta do terrorismo islâmico - ainda outro dia um seu agente disfarçado forjou a explosão de um avião de passageiros americano -, mas está aumentando sua produção.

Exageros? O tom da coluna pode parecer estranho, exagerado, mas ele reflete o clima de inação dos países que representam mais de 60% do PIB mundial, Estados Unidos, União Europeia, Japão. Os "músculos" do cérebro cansam ao ver tantos atletas correrem, pularem e ninguém lá fora fazer alguma coisa para evitar que o desemprego aumente, a economia afunde ainda mais. O Nobel de Economia, Paul Krugman, está de novo certo. Vamos acordar pessoal, vamos emitir dólares, euros, ienes, reduzir os juros, facilitar o crédito, aceitar mais inflação para, diz ele, acabar de vez com essa história.

Mas eles devem ter informações de que os outros não dispõem, sabem o que estão fazendo, pode-se argumentar. Pode ser, mas a informação básica, inelutável, está aí: a economia mundial mal saiu da recessão, recua e precisa de todos, absolutamente todos, os estímulos para evitar uma recaída, que já se inicia. Monetário, juros, financeiros, injeção de liquidez, fiscais mais gastos, mais investimentos em obras que, não prioritárias, poderiam ser adiáveis, mas devem ser construídas agora.

Um bom exemplo está aí, na China, que mesmo crescendo a 7,6%, mais que o dobro do PIB mundial, está iniciando um ousado plano de estímulo ao mercado interno, onde nada menos que 690 milhões de pessoas vivem no campo e migram para as cidades.

E o que se vê? Pouco. Ou melhor, nada. Parece que os bancos centrais lá fora têm metas indefinidas e contraditórias. Na zona do euro, é vigiar a inflação, nos Estados Unidos é isso, sim, mas também estimular o crescimento.

O que está havendo é um processo predatório de autoalimentação de mais desemprego, menos demanda, menos investimento, menos produção e menos crescimento.

E viva nós. Nesse cenário em que, apesar dos crescentes alertas do FMI, da OCDE, dos Prêmios Nobel de economia, não se faz nada lá fora como se tudo estivesse caminhando às mil maravilhas, o Brasil destoa para melhor. Está reduzindo os juros, aumentando credito, estimulando a demanda interna, tentando aumentar os investimentos numa tarefa árdua porque o setor privado não reage e a máquina estatal emperra. Mas pelo menos se caminha, se faz alguma coisa além da irritante e inquietante inércia que se vê nos Estados Unidos na Europa e no Japão.

E vivam os músculos... Enquanto isso, vamos nos conformar em assistir ao festival de músculos da Olimpíada e ver quem corre mais, pula mais, salta mais, nada mais. Desculpem, leitores, o desabafo, mas vocês também não estão "cansados" de tanta inércia lá fora que está ameaçando a gente no Brasil?

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