FOLHA DE SP - 10/07
SÃO PAULO - Acho que estava em férias ou algo assim, mas comi mosca. Foi só no finalzinho da semana passada que descobri que o Brasil passara os últimos 12 meses como um país onde se censuram obras de ficção. Minha decepção só não foi maior porque tomei conhecimento do caso ao ler que um juiz federal reverteu a liminar que ele próprio concedera um ano atrás e finalmente liberou a exibição de "A Serbian Film" em todas as salas do país.
O pedido de proibição veio do Ministério Público Federal em Minas (o mesmo que tentou censurar o dicionário "Houaiss"), devido a tomadas "que simulam a participação de recém-nascido em cena de sexo explícito ou pornográfica, além das que mostram sexo explícito, crueldade, elogio/banalização da violência, necrofilia, tortura, suicídio, mutilação, agressão no ambiente familiar".
Como não vi o filme, não posso julgar sua qualidade artística, mas sei que nada disso é muito original. Em "As 11 Mil Varas", o escritor Guillaume Apollinaire perpetra isso tudo e mais um pouco e o texto é hoje considerado um clássico da literatura.
Quem não gosta de ver esse gênero de coisa tem toda liberdade de não ir ao cinema, mas o Estado brasileiro, nos termos dos artigos 5º e 220 da Carta, abriu mão do poder de censurar todo tipo de expressão artística.
Sei que não existem direitos absolutos, mas a liberdade de expressão só faz sentido se for afirmada numa forma robusta. Ninguém, afinal, precisa de licença ou autorização para dizer ou mostrar o que todos querem ouvir e ver. Ou bem o instituto existe para abarcar casos como o de "A Serbian Film", ou ele se torna um penduricalho inútil na legislação.
E a liberdade de expressão, nunca é demais insistir, é importante porque, ao assegurar que todos os temas possam ser discutidos e sob todas as perspectivas, ajuda a sociedade a encontrar o balanço entre mudança e estabilidade, entre a saudável contestação e o necessário consenso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário