CORREIO BRAZILIENSE - 10/07
Começou na semana passada na Ilha de Jersey, paraíso fiscal que integra o Reino Unido, um julgamento com possíveis implicações na escolha do prefeito da cidade com mais eleitores no país. A prefeitura de São Paulo reivindica no processo ressarcimento de US$ 22 milhões.
O dinheiro está em contas bloqueadas da Durant International e da Kildare Finance, empresas que, segundo o Ministério Público, pertencem ao deputado Paulo Maluf (PP-SP) e são resultado do desvio de recursos públicos na construção do túnel sob o Parque Ibirapuera na época em que ele era prefeito.
Maluf nega que tenha desviado recursos e que seja dono dessas empresas. Mas terá de conviver com as notícias do julgamento do processo, já em fase de recurso, algo que deverá durar aproximadamente um mês. Quem também terá de lidar com isso é o candidato do PT Fernando Haddad.
Agora, em plena campanha, tende a ganhar evidência novamente a foto de Haddad, Lula e Maluf em meio aos jardins da casa do deputado, na rua Costa Rica, em São Paulo. E, com isso, surgirá edição revisitada dos argumentos que se espalharam quando, ainda na fase de arranjos das candidaturas, a deputada Luiza Erundina (PSB-SP), indignada com os afagos ao inimigo, abriu mão do posto de vice na chapa petista.
É claro que Haddad tem como se defender. Mas ter de se defender já é um problema. A prefeitura que ele pretende assumir está mais pobre em consequência, segundo a acusação, do que fez um aliado. Alguém cuja casa Haddad frequentou com desenvoltura.
Em política, apoio não se recusa, diz a velha frase pronunciada por tantos políticos, mais recentemente pelo pedetista Ronaldo Lessa, que é candidato a prefeito de Maceió com o apoio do ex-rival Fernando Collor. De fato não deveria causar comoção Haddad ter o apoio de Maluf, que amealhou 497 mil votos para a Câmara. Ele é uma das principais lideranças de um partido que se tornou aliado do PT há muito tempo e integra a base de apoio da presidente Dilma Rousseff.
A aliança, pode-se dizer, com grande chance de acerto, era algo já digerido pelo eleitor de esquerda. Mas disso a dizer que são irrelevantes seus novos contornos, tão explícitos, vai um longo caminho. Em defesa da irrelevância da foto, afirma-se que os tucanos, hoje favoritos na eleição paulistana, já se aliaram várias vezes a Maluf, em acordos fartamente fotografados. Por cuidado ou sorte, porém, só apareceram ao lado dele em atividades de campanha.
Outro argumento dá conta de que será difícil para o PSDB atacar a aproximação de Maluf com Haddad devido ao risco de, com isso, angariar mais antipatia para o próprio partido do que para o adversário. Afinal, se os malufistas ainda são muitos, os ex-malufistas são um contingente bem maior. Nem todos deixaram de votar em Maluf por discordância, mas sim porque não veem mais nele alguém capaz de liderar um projeto hegemônico. Consideram-se dispensados de votar em quem o deputado apoia, mas não deixam de se ofender com críticas ao malufismo. É inegável a necessidade de cuidado para quem quiser atacar a proximidade explícita entre Maluf, Lula e Haddad. Mas, em tempos de redes sociais, isso não é uma tarefa tão difícil.
O que suscita preocupação na aliança é a tentativa de grudar em Haddad a pecha de leniência com a corrupção. Ainda que, por todos os contra-argumentos acima, isso seja fraco, pode ganhar força se for associado a outro item: o mensalão. Os dirigentes petistas não escondem a preocupação com o julgamento que ocorrerá no STF a partir do início do próximo mês. Ora, se a exploração do processo tem peso, não se pode ignorar o risco de que a conotação moral da aliança com Maluf também tenha.
Mesmo se Haddad vencer a eleição, porém, a tese da irrelevância da foto não será necessariamente vencedora. O PT mudou muito nas últimas três décadas. Mas é exagero dizer que deixou de ser um partido que preza bandeiras. Alianças sem qualquer restrição de legenda ou, ao menos, de escopo podem transformá-lo em algo realmente indissociável dos adversários.
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