FOLHA DE SP - 08/07
Nós que passamos a vida à procura de alguma coisa que nem sabemos bem o que é e que nunca achamos
Este mundo tem coisas muito curiosas. Gatos e cachorros, por exemplo, servem para quê? E as girafas? E as flores?
Da minha janela vejo árvores e passarinhos que não fazem senão voar e pousar nos galhos, sempre muito inquietos; e alguém já viu passarinho dormir? Será que eles se afeiçoam entre eles ou a alguém? Será que passarinho pensa? Será que sofre?
Mas tem quem sofra por causa deles; tenho um amigo que, quando encontrou o seu morto na gaiola, ficou triste e entrou em depressão.
Passarinho eu não sei, mas cachorro e gato sofrem pelo dono, e uma vez, quando fiquei doente, meu gato não saiu de perto de mim um só instante.
Fico pensando se é justo ter um cachorro ou um gato. É verdade que quem tem é porque gosta, portanto trata bem; mas por outro lado, eles só comem o que nós queremos, o território deles é limitado e só têm vida sexual se a gente permite, e a gente nunca permite, olha que absurdo. Dizem os especialistas que se os machos não forem castrados e as fêmeas operadas, vão nascer ninhadas e mais ninhadas que serão abandonadas em um parque qualquer, e os filhotes vão morrer atropelados ou de fome, o que é de cortar o coração.
Mas é de cortar o coração também ver um gato olhando o mundo pela janela, um gato que não é dono de sua vida, que não pode passear quando quer e fazer o que lhe passa pela cabeça -e que nem sei o que seria. E volto a pensar: para que eles existem?
Girafas, zebras e leopardos correndo na selva são um lindo espetáculo, mas um hipopótamo ou um rinoceronte não despertam senão estranhezas. E as baratas? Bem que se podia passar sem elas, mas ouvi de um ecologista que se todas as baratas do mundo acabassem, o equilíbrio ecológico seria prejudicado, vai entender.
As cigarras, essas a gente sabe: seu canto é só alegria, e elas existem para anunciar o verão.
Frutas são todas lindas, e só servem para nos alimentar. Mas e o café? Como terá o primeiro homem inventado descascar o fruto, secar, torrar, moer e coar com água quente para o prazer de tantos?
E as borboletas? Não existe nada mais bonito do que uma borboleta voando, e às vezes penso que elas, como as flores, só existem para embelezar o mundo.
E os peixes, os sapos? Quem não caçou vaga-lumes e botou num vidro para brincar de lanterna pode dizer que teve infância?
E nós, para que existimos? Nós, que às vezes estamos felizes, outras infelizes, que brigamos com o carpinteiro porque a gaveta não ficou exatamente como se queria, nós que ficamos de mau humor porque engordamos dois quilos, nós que nos matamos para ganhar mais dinheiro e morar numa casa maior com mais armários e poder pagar bem caro a um médico para nos livrar dos tais dois quilos, nós que já fumamos, já bebemos e ainda comemos mais do que devíamos, que amamos e desamamos sei lá por que, e passamos a vida à procura de alguma coisa que nem sabemos bem o que é e que nunca achamos, e estamos, a maior parte do tempo, insatisfeitos, geralmente sem razão.
Nós, que vamos aos shoppings para escolher um vestido e um sapato e uma bolsa para usar numa festa que ainda nem sabemos se vai acontecer, nem se seremos convidadas, e se formos, talvez nem vamos ter vontade de ir, dá para entender?
Eu queria muito que alguém me explicasse tudo isso.
2 comentários:
cara Danusa , neste seu texto observo que pessoas que se preocupam com estas coisas , como a vida dos animais , a beleza das borboletas , são pessoa de sensibilidade , e ao passar para nós leitores , nos faz sensibilizar juntos.Queria sugerir a você que , ao invés de se preocupar , você com esta sensibilidade devia se Encantar , que tal , Danuza , no seu próximo texto, você nos falar do Encante-se , e nos proporcionar , fugindo , mesmo que momentaneamente do mundo atual, o encantamento da sua sensibilidade.
Querida Danuza,acabei de chegar de Paris,e pela suas dicas minha viagem ficou mais encantadora.Foi um maximo ter ido no L'Hotel e ter tomado um drink.E o "Da Rosa" sem palavras.Muito obrigado e realmente voce e luxo so.
Arthur Vianna.
San Francisco.
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