ZERO HORA - 27/06
O nome dele é Marco Cardoso Moreira, tem 50 anos e foi condenado à morte por tráfico internacional de drogas. Ao viajar para a Indonésia em 2003, foram encontrados mais de 13 quilos de cocaína na armação de um paraglider que ele transportava na bagagem, e desde então segue preso, aguardando a execução.
Muitas tentativas ainda estão sendo feitas pelo nosso governo para que Marco não sofra uma pena tão radical, mas chegou a ser anunciado num jornal de Jacarta que o brasileiro irá, nos próximos dias, enfrentar um pelotão de fuzilamento, junto a dois paquistaneses igualmente condenados por aquele país.
Pena de morte é sempre um assunto difícil e controverso. Ainda assim, um detalhe dessa tragédia me fez sorrir – pois é, acontece de a gente, às vezes, encontrar graça nas desgraças. A reportagem que li dizia que os três presos tiveram a chance de fazer um último pedido. Os dois paquistaneses pediram para conversar, pela última vez, com seus familiares. O brasileiro pediu uma garrafa de Chivas.
Não posso garantir a veracidade desse pormenor. Tem muito engraçadinho que escreve o que bem entende: dane-se o fato, publique-se a versão, caso ela pareça mais interessante. Mas, mesmo que não tenha sido bem assim, poderia ter sido, e fiquei pensando que um último pedido é um epitáfio em vida.
Diante da morte iminente, pedir para falar pela última vez com os familiares demonstra o desejo digno de trocar abraços, de se desculpar pelas besteiras cometidas e, vá saber, de revelar aos parentes a senha da sua conta secreta. Emocionante.
Mas eu compreendo o sujeito que, depois de tantos anos isolado num país distante, aguardando um veredicto que, se o livrar do fuzilamento, o conduzirá à prisão perpétua, já não conserva intenções nobres. Com o Diabo bufando em seu cangote e a contagem regressiva chegando perigosamente perto do zero (...6, 5, 4, 3...), ele tem o direito de mandar às favas seus arrependimentos e de só pensar em entornar uma garrafa de uísque antes de sair do ar.
Fausto Wolff faria o mesmo. Keith Richards, nem se fala. Janis Joplin. Pablo Picasso. O que não falta é gente que pediria sua dose com três pedras de gelo – e um amendoinzinho para acompanhar, se não for abuso.
Eu? Daqui onde estou, usufruindo de liberdade e nenhum paredão à vista, tenho a impressão de que agiria com o mesmo coração singelo dos paquistaneses, mas é muito fácil se atribuir virtudes quando não é o nosso destino que está na reta. Por isso é que esta cronista pisca o olho para Marco Moreira e não o condena, ao menos não pelo Chivas.
Uma despedida inspirada em Humphrey Bogart pode não merecer a bênção do Vaticano, mas é sempre mais autêntica e menos dramática. Não há de ser pecado demonstrar alguma insolência no final.
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