CORREIO BRAZILIENSE - 11/06
O país corre o risco de seguir por um tempo precioso na contramão da sustentabilidade. A redução do IPI dos automóveis é um exemplo
Quando Dilma Rousseff assumiu a Presidência da República há um ano e meio, seus ministros trataram a Conferência de Desenvolvimento Sustentável da ONU, a Rio+20, como a hora de o governo brasileiro se colocar como senhor da economia verde, da energia limpa e renovável. Um cenário pronto para que Dilma, soberana, fosse aclamada como a portadora das boas notícias e dos maiores exemplos para o mundo. Um olhar mais atento indica que esse copo ficou pela metade.
Quanto às boas notícias, Dilma as tem para dar, especialmente, no que se refere ao desmatamento. Os últimos dados divulgados pelo governo indicam que, na Amazônia Legal, 81% das florestas estão preservadas. O paÍs está entre os 10 que mais investem em energia limpa. A matriz energética limpa do Brasil é uma das maiores do mundo. Quanto ao cenário atual, não estamos mal.
Por falar em cenários…
Mas, quanto à perspectiva de futuro, é hora de o país repensar parte de suas escolhas. Embora a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, seja hoje uma das mais fortes perante a presidente da República e esteja bem focada no seu trabalho, há uma gama de decisões em outras áreas que ameaçam embaçar o Brasil enquanto janela para o mundo do desenvolvimento sustentável.
Na área econômica, há exemplos visíveis a olho nu de que o país corre o risco de seguir por um tempo precioso na contramão da sustentabilidade. A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos carros novos é o mais vistoso.
As montadoras de automóveis, de onde saíram muitos petistas históricos, estão em festa. Afinal, desde que o governo reduziu o IPI dos automóveis, as associações de concessionárias registram aumento de 150% nas vendas. O efeito positivo, entretanto, soa como um sinal de alerta quando combinado com a ideia de desenvolvimento sustentável.
O Brasil não possui uma infraestrutura para absorver essa frota. Tampouco há uma política de que privilegie o consumo de um combustível mais limpo para abastecer esses carros. Dados da Petrobras divulgados este ano indicam que 74% dos carros flex vão rodar com gasolina em 2012, porque sai mais barato e a oferta de combustível fossil é maior.
Por falar em etanol…
Em 2008, na reunião das Nações Unidas para Agricultura e Alimentos (FAO), o então presidente Lula propagou ao mundo que iria se tornar um mascate do etanol brasileiro. Lembrou em discurso que “os dedos apontados contra a energia limpa dos biocombustíveis estão sujos de óleo e de carvão”.
Um ano depois, comemorava a descoberta de óleo na camada pré-sal, hoje uma prioridade do governo brasileiro. Quanto ao etanol de cana, volta e meia há notícias da falta do produto nos postos e um preço nada competitivo quando comparado ao da gasolina. Ou seja, o discurso de 2008 parece ter ficado esquecido.
Por falar em discurso…
Para muitos especialistas, está cada vez mais claro que a Rio+20 se tornará mais uma reunião de balanço do discurso e da prática ao longo dos últimos 20 anos — o que, pelo andar da carruagem, mostrará a falta de compromisso dos governos com o que pregaram na Rio-92. Além disso, caminha para tornar mais rígidas as garantias de cumprimento de metas no futuro, e essa é a parte boa das discussões que tomarão conta do Rio de Janeiro a partir desta quarta-feira. Diante desse clima, a Angela Merkel, da Alemanha; David Cameron, da Inglaterra; e Barack Obama, dos Estados Unidos, preferem cuidar da própria vida em vez de vir ao Brasil levar um puxão de orelhas dos ambientalistas pelo não-cumprimento do que seus antecessores prometeram.
Obama, por exemplo, parece seguir à risca o que disse recentemente o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, sobre não ter um minuto a perder. Ocorre que Ban Ki-Moon se referia à economia sustentável. E tanto Obama quanto os europeus estão levando essa frase à risca em outras frentes. Dilma, a anfitriã, tem nas mãos um grande desafio. Dizer se continuará feliz com o copo pela metade ou se tratará de enchê-lo levando todas as políticas de governo ao rio do desenvolvimento sustentável. Até o momento, parece contentar-se com a primeira opção.
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