A Comissão Parlamentar de Inquérito tem hoje um dia decisivo entre o dever e o ímpeto de não fazer inquérito
QUEM TENHA alguma curiosidade sobre o país que está em moda no mundo tem dele uma radiografia esclarecedora se atentar, apenas isto, para os assuntos simultâneos que preenchem sua semana de ricaço do pré-sal, mandachuva da soja, do minério de Carajás, das carnes e de tanto mais.
Uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito tem hoje um dia decisivo entre o dever e o seu ímpeto de não fazer inquérito algum. E então não ser parlamentar nem comissão, mas um aglomerado que, excetuada meia dúzia de integrantes, mereceria ele próprio uma comissão de inquérito. Esta, verdadeira. E orientada, não pelos regimentos parlamentares, mas pelos códigos penais.
Caso a CPMI não aprove hoje a convocação dos dirigentes da Delta Construções e de seu "ex-dono" Fernando Cavendish, não haverá o que esperar dela. A não ser a exibição de seu presidente e do relator, Vital do Rêgo e Odair Cunha, em escapismos comprometedores.
Como a inverdade de que a chamada Delta Centro-Oeste independe, em suas operações, da Delta central. Ou seja, não liga esta à rede de Carlos Cachoeira e seus negócios. A persistir tal inverdade como fator determinante do "inquérito", os desmoralizados pela CPMI serão os seus condutores.
Mas o país assegura sua realidade, caso a CPMI se reduza a vexame, com a entrada ativa da Comissão Nacional da Verdade. O nome e a necessidade de criá-la, a par da necessária grandeza para criá-la, já dizem o suficiente a respeito.
O que cabe é registrar que as contradições internas da comissão, dadas por muitos como irrelevantes ou dirimidas, não são uma coisa nem outra. Componentes da comissão já se veem confrontados com casos complexos, trazidos por múltiplas intermediações, que vão requerer mais do que a simples identificação de "crime de Estado" ou não, para serem examinados.
A força emocional do tema entregue à Comissão da Verdade é, por si só, suficiente para mobilizações na opinião pública. Mais incisivas na ocorrência de casos que suscitem controvérsia sobre seu enquadramento nos objetivos da comissão.
O problema que aí desponta está no grau de racionalidade, dentro e sobretudo fora da comissão, com que tais casos sejam considerados. O risco de que a controvérsia desande existe, e propõe uma pergunta: estamos preparados para fazer a convivência das emoções com a racionalidade?
Há também um Conselho de Ética em ação, encarregado de sugerir ao Senado o que fazer do senador Demóstenes Torres. Ou seja, com o ponta de lança político do Carlos Cachoeira que vai surfando sobre a CPMI. Mas a impressão que prevalece, ao menos para os meus ouvidos, é de que a situação do senador estará incerta até a decisão do plenário. Parece não haver vontade de vê-lo cassado, a menos que seja impossível poupá-lo.
Comissão por comissão, hoje abre suas portas, mais uma vez, a segunda de Anistia -aquela que concede indenizações e, por critérios a meu ver ininteligíveis, distribui outras verbas a alegadas vítimas financeiras ou profissionais da ditadura. E lá será decidida a doação ou recusa da indenização pedida pelo Cabo Anselmo. Só o fato de que este cúmplice de numerosos assassinatos esteja por aí, solto e sustentado misteriosamente, é um crime de Estado do qual o Estado não pode ser anistiado, nunca.
Mais um? Pode ser a trapaça investigada, pela Polícia Federal e pela Superintendência de Seguros (Susep), no leilão do Hotel Nacional, no Rio. Basta uma frase a respeito: nenhum dos lados se salva na armação do negócio e no negócio propriamente. E Cachoeirinha, ainda que pareça impossível, é o de menos nessa história.
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