terça-feira, maio 22, 2012

Os novos "3 em 1" de Lula - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 22/05


Lula se prepara para sair da eleição municipal com três dívidas na banca política do governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Quando e se vai pagar, o tempo dirá

Quando concorreu à Presidência da República pela primeira vez, em 1989, Lula ficou meio constrangido num debate quando o adversário Fernando Collor de Mello mencionou que ele havia comprado um aparelho de som “três em um”, aqueles trambolhos da década de 1980 que reuniam rádio, toca-discos e toca-fitas (ainda vivíamos na era do bolachão, muito longe do MP3). Agora, 23 anos depois, ele recebeu dos vereadores paulistanos outro três em um: numa única solenidade, Lula ganhou o título de Cidadão Paulistano, o diploma de Gratidão da Cidade e a Medalha Anchieta. A data não poderia ser melhor para tentar alavancar o petista Fernando Haddad nas pesquisas de intenção de voto para prefeito de São Paulo, antes da largada da campanha.

Lula está focado nesta eleição. Hoje, os petistas têm plena consciência de que foi um bom negócio o ex-presidente evitar a prévia paulistana. Conhecedor de seu partido e das vaidades de cada estrela, ele não queria correr o risco de o PT ficar dividido na eleição paulistana. O problema é que, se Haddad não demonstrar logo que tem traquejo para a campanha, só mesmo Lula para cumprir a tarefa de unir o partido em torno do candidato, ainda que a contragosto de alguns. Que ficaram insatisfeitos com o fim da prévia, caso da senadora Marta Suplicy.

No geral, o PT já se deu conta de que jogou tanta energia em São Paulo para conquistar uma das principais glebas tucanas que se esqueceu do restante do país. A prévia de Pernambuco, por exemplo, correu solta e terminou na “delegacia”, para ser resolvida por outras instâncias partidárias. Também pudera. A 10 dias da votação, os principais apoiadores de Maurício Rands estavam praticamente fora da campanha pelos corações dos militantes. O ex-prefeito João Paulo Lima, deputado federal, estava em Brasília, com toda a razão, cumprindo com as obrigações constitucionais para as quais fora eleito. O senador Humberto Costa (PT-PE) tinha outros afazeres urgentes. Relator do processo contra Demóstenes Torres no Conselho de Ética do Senado, dedicou-se em tempo integral à análise do caso. O governador Eduardo Campos (PSB) estava na China. Rands ficou sozinho enquanto o atual prefeito, João da Costa, amparado pela máquina da reeleição, conquistou 51,9% dos votos no último domingo, numa votação cercada de acusações de fraude.

Por falar em amparo…
Depois da briga entre as duas alas do PT, têm-se a sensação de que nada mais unirá os petistas do Recife, nem Lula, com seu discurso de encantador de serpentes. A divisão pode ser a senha para que o governador Eduardo Campos termine optando por outro candidato à Prefeitura do Recife. Assim, o nome do ministro da Integração, Fernando Bezerra Coelho, antes colocado apenas para tentar incutir algum juízo na cabeça dos petistas, pode virar realidade. Eduardo Campos, porém, é mais suscetível aos apelos de Lula do que o próprio PT. Agora, só mesmo um apelo de Lula para que Campos apoie João da Costa.

Assim, Lula tem outro “3 em 1”. Mas esse é de dívidas com o governador de Pernambuco. Pediu que tirasse Ciro Gomes da sucessão presidencial em 2010, e Eduardo atendeu. Este ano, pediu por Haddad — a aliança será formalizada daqui a alguns dias, num acordo casado que envolveu a Prefeitura de Belo Horizonte. Agora, Eduardo já fez chegar a quem interessar possa, que, se João da Costa se mantiver como candidato, ele só resolverá esse imbróglio da sucessão no Recife com Lula e a presidente Dilma. Assim, Lula agora tem três deferências em São Paulo e três débitos com o governador de Pernambuco. Bem… muito melhor que o antigo 3 em 1, hoje quase uma peça de museu.

Por falar em Dilma…A presidente da República é sempre simpática ao governador Eduardo Campos, mas já avisou a alguns aliados que, apesar disso, não tem como trocar de vice, se for candidata em 2014. Na frente de pelo menos um ministro, ela já comentou que, “se” for candidata à reeleição, irá repetir a chapa. Não por acaso, os peemedebistas correram para desfazer o alvoroço perante o discurso de Nelson Jobim na última quinta-feira, quando, durante um encontro do partido, o ex-ministro da Defesa pregou a candidatura própria. A cúpula da sigla considera melhor uma Vice-Presidência ao alcance da mão do que a incerteza de lançar um nome próprio — que poderia até mesmo terminar confundido com um aparelho 3 em 1 das antigas. Melhor não arriscar.

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