CORREIO BRAZILIENSE - 03/05/12
Entre os senadores, há uma vontade implícita de recuperar a imagem do Senado. Diante de tanta confusão e fios de meada na CPI de Carlos Cachoeira, o pedido de cassação de Demóstenes soará como um nós somos legais
Se depender do relatório do senador Humberto Costa (PT-PE) ao Conselho de Ética, o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO) pode se preparar para, num futuro não muito distante, curtir as suas garrafas de Cheval Blanc sem se preocupar com as sessões do Senado no dia seguinte. Ou aproveitar para se dedicar a lições de gastronomia na cozinha nova de seu apartamento. Isso porque, a depender do que se dizia ontem nas conversas reservadas, Demóstenes cairá como todos aqueles que o antecederam e, sem o aval de seus respectivos partidos, terminaram cassados porque “faltaram com a verdade” na tribuna do Senado. Ao discursar, ainda em março, Demóstenes dissera não ter nada a ver com Carlos Cachoeira e, menos de uma semana depois, estava clara a ligação entre eles, coberta de presentes, inclusive um telefone celular.
Costa tomou ainda o cuidado de não usar as gravações que Demóstenes tentou anular por intermédio de seus advogados. Uma forma de tentar evitar que, a partir de hoje, o senador tente anular o relatório na Justiça. O cuidado é válido, mas é sempre bom lembrar que a Justiça nunca se meteu nesse campo de tentar segurar um mandato quando o Conselho de Ética considera que deve ser cassado. Ali, entre as excelências, o julgamento é político e o que serve de válvula de escape no mundo jurídico nem sempre funciona.
Todos os demais senadores que foram cassados ou que renunciaram para escapar do cadafalso estavam no ponto em que Demóstenes se encontra hoje: sem apoio dos partidos. No caso de Luiz Estevão, por exemplo, que foi cassado por conta das apurações da CPI do Judiciário, era quase como um zumbi. Ele disse ao plenário que não tinha nada a ver com a Incal, a empresa enrolada no caso do TRT de São Paulo. E, mais tarde, um contrato de gaveta o colocou no epicentro da trama. Por isso, perdeu o mandato. À época que Estevão ainda circulava pelos corredores, um de seus ex-colegas de partido chegou a me dizer certa vez que o então senador pelo PMDB precisa entender que a “roda da fortuna girou e ele foi espirrado”.
José Roberto Arruda, outro caso notório do Distrito Federal, não chegou a passar pela cassação. Renunciou antres disso, poupando trabalho aos senadores. Mas, seu processo de desgaste entre os colegas não foi diferente. Arruda foi à tribuna dizer que não tinha nada a ver com a violação do painel eletrônico. Jurou pelos filhos. No dia seguinte, estava lá de volta, mudando tudo o que dissera no dia anterior. Foi a conta. Não tinha clima para mais nada. O PSDB lhe mostrou a porta de saída do partido. Alguns que antes eram apenas sorrisos diante dele, fechavam a cara quando ele passava.
Por falar em fechar a cara…
Com Demóstenes não é diferente. Mesmo aqueles que o cumprimentam de forma cordial não deixam de soltar um comentário quando ele vira as costas. O mínimo que dizem é que ele vestia um personagem no Senado, mas, de fato, era outra pessoa. O próprio senador goiano chegou a dizer “não sou mais o Demóstenes”. Precisa mais, para se ter a certeza de que o parecer a ser apresentado hoje será em favor da cassação? Politicamente, neste momento, Demóstenes está liquidado. Digo neste momento porque, como dizia o ex-senador Heráclito Fortes (DEM-PI) ao ver Arruda governador anos depois, “em política, muitas vezes o fundo do poço tem mola”. Vejam aí Fernando Collor, hoje de integrante da CPI. Quem diria…
Entre os senadores, há uma vontade implícita de redenção. Diante de tanta confusão e fios de meada na CPI de Carlos Cachoeira, o pedido de cassação de Demóstenes soará como um “nós somos legais”, ou seja, não estão ali para acobertar A, B ou C. Bem… Pelo menos aqueles que não têm respaldo partidário ou que não foram flagrado contando uma versão a seus pares que não se sustentou. O líder do PMDB, Renan Calheiros, por exemplo, passou por um escândalo envolvendo seu nome. Em nenhum momento, Renan negou que houvesse feito o pagamento de uma pensão alimentícia por intermédio de um amigo, funcionário de uma construtora. Por manter a sua versão — e não a ver desmentida — ficou por ali. Perdeu a Presidência do Senado, mas não a solidariedade da Casa. Com Demóstenes, ao que tudo indica, não será assim. A partir de hoje, dizem muitos senadores, é só questão de contar os prazos para que ele seja um ex-senador com tempo para várias garrafas de Cheval Blanc. Vamos aguardar.
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