O ESTADÃO - 03/05/12
Faz tempo que não temos políticas consistentes e de longo prazo para o setor aéreo. É uma falha grave, tratando-se de um setor que, pela complexidade e exigência de coordenação dos seus segmentos, necessita de políticas e diretrizes muito bem formuladas. Um dos aspectos mais negligenciados tem sido o da aviação regional, o que é surpreendente, em razão do seu grande potencial de desenvolvimento.
O Brasil, com sua extensão continental, a exemplo do que ocorreu nos EUA, expandiu aceleradamente suas fronteiras agrícolas, ocupando novas áreas e consolidando novas cadeias produtivas. O agronegócio foi um dos grandes responsáveis pelo crescimento econômico, promovendo tanto a redução dos desequilíbrios regionais como a maior inserção na globalização. Consequência importante foi a geração de fluxos não só de mercadorias, mas de pessoas que se deslocam em função das mudanças na configuração econômica do território. Ora, parte importante das pessoas que desbravam o território e alteram os parâmetros econômicos se desloca por meio da aviação regional, executiva e táxis aéreos. O problema é que as infraestruturas aeroportuárias e aeronáuticas não acompanharam, em termos de capacidade e equipamentos, o crescimento da demanda. Esse é um fator restritivo tanto ao desempenho do moderno agronegócio quanto do potencial de especializações regionais e formação de novas cadeias produtivas, polarizadas por cidades de porte médio, dispersas pelo País.
Porém, falta interesse privado em investir na exploração de aeroportos regionais nesses centros de porte médio. A União e os governos estaduais, por sua vez, não têm manifestado interesse em lançar um programa de grande envergadura para promover concessões e parcerias voltadas para a modernização dos aeroportos regionais. Da mesma forma, não existe uma política para a aviação regional que possa balizar este segmento no médio e no longo prazos. Evidentemente, tal política deve ser parte de políticas e diretrizes mais abrangentes para o setor aéreo como um todo.
E por que ela é necessária? Primeiro, em razão da competição predatória que afeta muitas empresas que operam a aviação regional. Aeronaves de grande porte de empresas de âmbito nacional se superpõem às rotas regionais. Beneficiam-se de seu baixo custo marginal para promover a competição com empresas que utilizam aeronaves menores em rotas regionais. Esse problema é particularmente grave para as empresas regionais que operam nas regiões de maior densidade econômica e de deslocamento das fronteiras agrícolas.
Outro aspecto do problema é a questão dos "slots" nos grandes aeroportos. Questão ainda em suspenso, uma vez que a distribuição continua beneficiando mais as empresas que operam rotas de âmbito nacional. Essa é uma grande barreira para que as empresas regionais possam operar o tráfego de coleta e distribuição nos aeroportos aglutinadores, os chamados "hubs".
Por fim, a aviação regional carece,ainda, de políticas tarifárias adequadas. É preciso ter a clareza quanto ao fato de existirem três tipos de aviação regional: 1) a que acompanha o deslocamento das fronteiras econômicas e orienta suas rotas pelo crescimento e potencial da demanda; 2)a que coleta ou distribui passageiros em âmbito mais restrito (um Estado, por exemplo) e que, também orientada pelo potencial de mercado, opera rotas de curto percurso; e 3) a que opera rotas na Amazônia, que nem sempre pode se valer do mercado, pois presta também serviços que podem ser considerados como essenciais e até de caráter social. Neste caso, podem ser necessárias eventuais concessões de subsídio para serviços específicos.
Após tantas atribulações, vivemos um bom momento para pensar na formulação de uma política abrangente para o setor aéreo. É importante contemplar a aviação regional e estabelecer com clareza os objetivos e prioridades do governo. No setor aéreo, parafraseando Millôr, pode-se criar um mundo inteiramente novo. Caos não falta...
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