O GLOBO - 12/04/12
Mas ainda não temos o Cadastro Positivo. A coisa está em debate há mais de dez anos, ficou a maior parte disso no Congresso. Em junho do ano passado, foi aprovada uma legislação básica, mas cuja implementação depende de um decreto do governo federal para regulamentar todo o processo. E que permanece em, digamos, negociações.
Por que demora tanto? No essencial, por causa de uma espécie de ideologia dos coitadinhos, segundo a qual o consumidor brasileiro e o tomador de empréstimo são uns idiotas que não sabem cuidar de suas finanças. Assim, precisam da proteção do Estado, pois quando caem na malha dos devedores inadimplentes isso se deve, tal é a explicação, à ação quase criminosa dos bancos e financeiras.
Não que estes sejam os mocinhos da história. Todo mundo tem uma bronca qualquer com o seu banco. As mais frequentes: pouca transparência, informações precárias sobre tarifas e custos dos serviços, tarifas exageradas e muita cobrança na base do "se colar, colou". Assim: cobram uma taxa no cartão de crédito, o cliente reclama, e a taxa é cancelada. Vem uma tarifa no extrato, o freguês protesta e ganha o "desconto". Denota uma certa malandragem e/ou desorganização. Afinal, eles deveriam saber de quem cobrar e quanto. E, sabendo, não poderiam cometer aqueles erros, se é que são erros.
Curiosamente, há menos reclamações quanto à própria taxa de juros. O consumidor aceita tranquilamente as seis "parcelas sem juros". É claro que tem juros, a maioria sabe disso, mas quase ninguém se preocupa em fazer a conta. Aceita-se o "sistema" - e essa é uma das causas dos juros mais altos. Os consumidores deveriam ser mais bravos nessa relação.
Mas até aqui estamos falando dos clientes normais, que pagam em dia e formam a imensa maioria. Uma coisa é a lei do consumidor regular essa relação. Outra, bem diferente, é a legislação e a tendência no Judiciário de proteger os devedores em quaisquer circunstâncias.
Juízes frequentemente decidem que a inadimplência não é motivo para a suspensão dos serviços não pagos. Não raro, dificultam a execução de garantias. E, mais recentemente, em algumas cidades, tribunais têm decidido pela anulação de contratos de financiamento de carros sob o argumento de que os juros são abusivos.
Ora, não são juros baixos, longe disso, mas são o preço do mercado e, de todo modo, trata-se de contratos firmados entre pessoas adultas e responsáveis, que sabem muito bem o que estão fazendo. Parece que se trata de mais um daqueles golpes que aproveitam a lentidão e o viés pró-devedor do Judiciário. O sujeito assina o papel, pega o carro e vai logo contestar a prestação.
Tudo considerado, qual o problema com o Cadastro Positivo? Ali estarão os nomes da imensa maioria que paga em dia e que será beneficiada por esse retrospecto. É bom para o cliente, bom para o banco, bom para a economia, pois deve levar a uma redução dos juros.
Não prejudica ninguém, certo?
Errado, diz o pessoal que vê o devedor como vítima do insaciável sistema financeiro. A restrição: o Cadastro Positivo é uma discriminação. Como? O cliente que não tiver seu nome ali será um "excluído" do mercado, tal é a argumentação.
Não faz sentido. Esse cliente não conseguirá financiamento ou terá que pagar juros mais altos justamente porque está inadimplente, não porque não consta do Cadastro Positivo.
Entre os devedores, a maioria não paga porque não consegue, não por vontade. São pessoas que se planejaram mal ou que sofreram um baque, como o desemprego ou uma doença na família, levando a uma perda de renda disponível. Para esses casos, a saída é a negociação direta ou nos órgãos de defesa do consumidor ou mesmo dos tribunais. Deve haver regras disciplinando essa situação.
Mas não se pode punir todo o universo de devedores com uma legislação tão restritiva ao crédito que termine por encarecê-lo. Não se pode colocar tanta limitação ao uso do Cadastro Positivo que ele se torne uma informação inútil e nivele todo mundo no lado do risco maior. E se o governo quer mesmo derrubar os juros, poderia também reduzir alguns impostos.
CARRÃO IMPORTADO
Não é só a presidente Dilma que circula por Brasília em carro importado. O presidente da CNI, Robson de Andrade, percorre os ministérios, em sua defesa da indústria nacional, em um Ford Malibu.
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