sexta-feira, abril 20, 2012
Impulsividade argentina custa caro - EDITORIAL O GLOBO
O Globo - 20/04/12
A Argentina vê-se numa posição desconfortável, no plano internacional, com sua decisão de expropriar a empresa petrolífera YPF, cujo controle acionário pertencia aos espanhóis da Repsol. Em seu confronto com o país sul-americano, o governo espanhol recebeu apoio inequívoco da União Europeia. O "Wall Street Journal" fez editorial muito duro contra "um ato que o mundo civilizado está qualificando como roubo".
O Brasil manteve uma cautelosa posição de neutralidade, que tem caracterizado, nesses casos, sua política internacional. Mas o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, por natureza um homem equilibrado, não teve cerimônias ao receber o chefe do governo espanhol, Mariano Rajoy. "Aqui não expropriamos, presidente Rajoy", foi o seu comentário, depois de afirmar que as empresas espanholas não encontrarão surpresas na Colômbia porque "aqui se cumprem as regras do jogo".
Assim se delineia uma situação em que a Argentina pode encontrar-se numa posição de isolamento. Na memória de possíveis investidores, ainda está presente a grande moratória de 2001, em que o país decretou o default na maior parte de suas dívidas. Aquele era um momento dramático na história argentina, em que tanto a política quanto a economia tinham chegado ao fundo do poço - como se viu com a rápida sucessão de três presidentes. Ali começou a dinastia Kirchner, com uma dose de audácia que surpreendeu o mundo, mas que, para os próprios argentinos, correspondia a uma recuperação de parte do seu orgulho ferido.
Dali em diante, a Argentina manteve-se à margem, com satisfações apenas parciais a seus credores; mas foi beneficiada (assim como o Brasil) por um período excepcionalmente favorável de trocas comerciais - commodities como a soja alcançando valorização inédita. Por vários anos seguidos, o país chegou a crescer a taxas asiáticas.
Seria o momento de ter lançado as bases para o futuro, para um relativo retorno à realidade.
Mas logo começou a funcionar uma síndrome que vem dos tempos de Perón - um tipo de política demagógica cujo objetivo quase único é a perpetuação no poder. Em vez de caminhar na direção das realidades econômicas e políticas, o kirchnerismo de Néstor, sucedido pelo de Cristina, apostou numa persistente negação dos fatos. Ignorou-se a ameaça da inflação. O governo praticou uma política de subsídios que, se lhe rendia dividendos políticos, solapava os alicerces da economia.
Assim se chega ao quadro de agora. Substancialmente enfraquecido o "vento de cauda" que ativava o crescimento econômico, desfeitos os superávits da balança comercial, fica claro que o modelo kirchnerista não se sustenta nas bases em que estava colocado. Mas em vez de praticar o necessário mea culpa, o governo da sra. Kirchner dobra a aposta: cria adversários internos e externos, ao comportar-se com uma impulsividade que passa ao largo de avaliações racionais. O preço será pago pelos próprios argentinos.
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