O GLOBO - 03/04/12
Tudo que o partido Democratas quer é se descolar da imagem do senador Demóstenes Torres, para interromper a sangria que as recentes revelações de suas relações promíscuas com o bicheiro Carlinhos Cachoeira têm provocado.
Nos últimos dias, prevendo o desfecho contrário às suas pretensões, o senador parecia estar "em estado de torpor, muito sem rumo", e propôs acordos considerados "inexequíveis" pela maioria da direção partidária, que já avaliava sua situação definida a partir das novas revelações deste fim de semana.
Foi colocado para ele que sua presença no partido já não era aceitável, havia um clamor geral que não deixava alternativa a não ser sua desfiliação ou abertura de um processo sumário de expulsão.
O partido já aguentou o que podia aguentar, deu o tempo que podia dar, na avaliação de seu presidente, senador Agripino Maia, e o que não se quer agora é colocar em risco o futuro do partido, se é que ele ainda é viável depois de tantas baixas com a criação do PSD, mas, sobretudo, com dois de seus mais importantes líderes sendo apanhados em escândalos de corrupção que não deixam margem a dúvidas.
Não se fala de extinção do partido nem mesmo de sua fusão com o PSDB ou o PMDB, ou melhor, se fala, sim, mas tudo a depender do resultado das eleições municipais, que será, esse sim, o definidor dos caminhos.
Se o partido se sair razoavelmente bem das urnas, mostrando perspectiva de futuro, Agripino Maia e seus companheiros de direção partidária acham que conseguem segurar uma segunda debandada.
"Os valores que nós tínhamos para disputar as eleições municipais estão mantidos e fortalecidos pela decisão de cortar na carne", avalia Maia. "Mais uma vez o partido será o único a tomar uma atitude radical, coisa que nenhum outro tomou", frisa, lembrando que o Democratas já expulsara o ex-governador de Brasília José Roberto Arruda, enquanto partidos envolvidos em escândalos como o PT continuam mantendo em seus quadros, muito prestigiados, correligionários envolvidos no mensalão.
Se o partido toma uma posição correta, o discurso continua vivo, ressalta Maia, para lembrar que existem ainda candidatos fortes em seus quadros.
O partido hoje joga seu futuro em duas candidaturas de peso no Nordeste, ACM Neto, em Salvador, e João Alves, em Sergipe, além de tentar indicar o companheiro de chapa de José Serra em São Paulo.
Na avaliação de Agripino Maia, se ACM Neto vencer em Salvador, e Serra, em São Paulo, "a oposição terá se saído bem nesta eleição".
As negociações com o PSDB na Bahia esbarram na insistência do ex-prefeito Antonio Imbassahy em concorrer, em que pese aparecer bem atrás de ACM Neto nas pesquisas eleitorais.
Mas o acordo parece bem encaminhado no sentido de ter o endosso do partido a ACM Neto, em troca de apoio em São Paulo a Serra.
Se bem que, de qualquer maneira, para o DEM estar acoplado à candidatura de Serra em São Paulo, é um trunfo político forte na luta pela sobrevivência, especialmente na situação atual.
Outro trunfo que o DEM pretende preservar é o tempo de televisão, que lhe dá força nas negociações políticas.
Ainda mais que existe a possibilidade clara de o PSD não conseguir ficar com o tempo dos seus filiados, tornando-se um parceiro sem grandes atrativos nesta eleição municipal.
Depois das eleições, eles pretendem repensar a estratégia futura "em função do que as urnas falarem". A questão da fusão com o PSDB ou o PMDB, ou mesmo a dissolução da legenda, será discutida de acordo com o resultado das eleições municipais, e Agripino Maia acha que, mesmo para uma eventual negociação futura, o mais importante é "não perder o discurso".
Maia, desde que assumiu a presidência do DEM em uma situação crítica, defende que o caminho é fazer de suas convicções seu carro-chefe. "Quanta gente no Brasil não quer um Estado inchado, quer ver a infraestrutura feita, e aceita que seja com capital privado, para ter aeroporto, estrada, porto, como muitos países fizeram. Brigar contra a alta carga tributária é brigar pela competitividade do país."
Ele rejeita a ideia de que o partido seja de direita, mas o classifica, sim, de "um partido moderno" e cita países da América do Sul que são dirigidos por partidos semelhantes, como Chile, Peru e Colômbia.
Seu sonho era fazer a massificação das ideias liberais do partido, não apenas durante as campanhas eleitorais. "Temos que colocar em prática nossas ideias".
Esse sonho foi atropelado pelo prefeito paulistano, Gilberto Kassab, que criou o PSD a partir de uma base do DEM, e teve outro contratempo que parece intransponível com a derrocada de um de seus principais líderes, o senador Demóstenes Torres, justamente aquele que parecia disposto a vocalizar os valores conservadores defendidos pelo DEM.
A refundação programática do partido, numa posição que era classificada de "centro-humanista e reformadora", não foi seguida da reformulação das bases partidárias, e os chamados cartórios eleitorais continuaram em vários estados.
A mudança programática já se desenhava desde uma reunião da Internacional Democrática de Centro (IDC) realizada no Rio em 2005. A IDC se contrapõe à Internacional Socialista, que reúne os partidos de esquerda e social-democratas no mundo.
O que os Democratas defendem é que está na hora de uma verdadeira experiência liberal, com uma reforma do pacto federativo para diminuir o tamanho do Estado e para conseguir também uma redução de impostos.
A vontade de ser um grande partido liberal, próximo especialmente da classe média, trabalhando questões que afetam seu dia a dia como meio ambiente, altos impostos, desemprego, apagão aéreo e insegurança pública, terá de ser mais uma vez adiada, enquanto tratam de uma realidade mais dura, a crise de credibilidade provocada pelas denúncias, aparentemente irrespondíveis, contra o senador Demóstenes Torres.
Nenhum comentário:
Postar um comentário