FOLHA DE SP - 04/04/12
O protecionismo proporcionará ganhos a alguns setores industriais e perdas aos demais
Há algumas semanas esta Folha publicou manchete reportando que ao final de 2011 a parcela da indústria no PIB havia recuado para 14,6%, ante um máximo de 27,2% em 1985.
A leitura dominante da reportagem parece ter sido bastante negativa, como se a redução da parcela da indústria no PIB seja evidência de certa involução na estrutura econômica do país.
É verdade que, em 1985, em uma economia forçada à autarquia pela crise do balanço de pagamentos e a carência de reservas internacionais, o desempenho comercial da indústria brasileira era aparentemente mais forte do que o atual.
É verdade, também, que o Brasil era então uma espécie de Grécia tropical, estava virtualmente insolvente, vivia recorrendo ao FMI e falhando em cumprir seus compromissos internacionais.
Mais que isso: em 1985, a economia tinha uma taxa de inflação de 10,8% ao mês. O total do ano chegou a 242%, com viés de alta.
Não obstante o saudosismo inapropriado, as cobranças de ações "decisivas" na defesa da indústria têm se intensificado.
A resposta do governo aos problemas do setor industrial tem sido uma combinação de maior ativismo no mercado cambial e reforço na defesa comercial.
Se for efetivo, o protecionismo proporcionará ganhos a alguns setores industriais protegidos e às regiões nas quais estes estão instalados e perdas aos demais setores, bem como aos consumidores em todas as outras regiões do país, que terão escolhas mais restritas e, muito provavelmente, preços maiores.
Mas esses efeitos podem tardar a ficar evidentes e podem, em princípio, ser compensados porpolíticas de transferências de recursos públicos, caso haja folga para tanto.
Outros impactos podem ser mais imediatos, em especial sobre a dinâmica dos preços e a inflação.
A inflação do componente da indústria do IPCA nos 12 meses findos em fevereiro foi de 2,83%, ante 5,97% para os preços livres em geral e 8,10% para os preços de serviços.
Cabe notar também a contribuição do bom comportamento dos preços industriais para o recuo dos índices gerais de preços, o que, como destacado em apresentações recentes de autoridades monetárias, tende a ajudar a conter também a inflação para os consumidores.
Os observadores da conjuntura econômica devem lembrar que, em 2004, uma reforma tributária que se esperava neutra do ponto de vista de arrecadação e inflação -e que incluiu introdução da cobrança de PIS e Cofins sobre importados, medida que deveria ter sido compensada por reduções nas tarifas de importação que acabaram não ocorrendo- teve impacto inflacionário relevante.
Isso deve ter contribuído para a decisão do Banco Central de elevar a taxa de juros a partir de setembro daquele ano.
Diante do exemplo de 2004, não seria de surpreender se a preocupação com o impacto inflacionário do crescente ativismo na defesa comercial tenha sido um dos elementos que levaram o Banco Central a se comprometer, tanto quanto as autoridades monetárias o fazem, com um cenário no qual "se contempla a taxa Selic se deslocando para patamares ligeiramente acima dos mínimos históricos e, nesses patamares, se estabilizando", em vez de avançar no processo de flexibilização, como em um certo momento chegou a acreditar boa parte do mercado financeiro.
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