VALOR ECONÔMICO - 21/03/12
Em uma pesquisa feita junto a cerca de 60 analistas no final de 2010, o Banco Central (BC) constatou que a estimativa mediana do mercado para o Produto Interno Bruto (PIB) potencial brasileiro era de 4,5% na época. Não obstante, desde o fim de 2011, alguns analistas vêm questionando essa estimativa, sugerindo que o potencial brasileiro já estaria mais próximo de 3,5% - o BC perdeu a oportunidade de atualizar essa estimativa no começo de fevereiro de 2012, quando perguntou aos analistas as estimativas de juro neutro, da taxa de emprego que não acelera a inflação (Nairu) e impacto da nova Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) sobre o IPCA.
A aplicação de um filtro à série dessazonalizada do PIB brasileiro sugere que o potencial estaria em torno de 3,7% ao ano no fim de 2011. O problema dessas estimativas puramente econométricas é que elas são bastante instáveis na ponta, além de serem muito ateóricas.
Nesse sentido, outras metodologias são mais robustas. A primeira delas é a estimação de uma curva de Phillips, a partir do conceito teórico de que quando o crescimento do PIB efetivo é igual ao potencial, não há aceleração da inflação. Tomando por base dados anuais entre 2003 e 2011 e a evolução do IPCA livres, essa conta aponta um potencial de 4,3% ao ano (essa estimativa não muda caso se considere a série do IPCA retroativo construído pela LCA a partir dos pesos da nova POF que passaram a ser incorporados no cálculo do IPCA a partir de janeiro de 2012). Caso seja considerado apenas o período 2006-2011, o potencial estimado cai para 3,9% ao ano (variação que sobe a 4% quando se considera o IPCA retroativo).
A outra metodologia para estimação do PIB potencial é a de função de produção, que decompõe a evolução do crescimento da capacidade de oferta doméstica em três grandes condicionantes: estoque de capital, oferta de mão de obra e ganhos de produtividade.
O estoque de capital brasileiro, série estimada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) até 2008 e atualizada pela LCA com os fluxos trimestrais de investimento e considerando uma depreciação de 4,7% ao ano, avançou 4,4% em 2011, mantendo o mesmo ritmo de alta observado em 2010. Assim, caso a única restrição à expansão da oferta no Brasil fosse esse fator de produção, nosso potencial de crescimento estaria hoje em 4,4% ao ano.
Não obstante, esse fator de produção tem um peso de "apenas" 40% na função de produção brasileira, com os outros 60% dependendo da oferta de mão de obra. A oferta de mão-de-obra, sob um prisma de médio e longo prazos, está associada à evolução da População em Idade Ativa (PIA) e também da tendência da taxa de participação - razão entre a População Economicamente Ativa (PEA) e a PIA.
Como a taxa de participação brasileira hoje já se encontra em um nível historicamente elevado, o crescimento da oferta de mão de obra tem dependido basicamente do crescimento da PIA, que se elevou em 1,5% em 2011 (as estimativas oficiais do IBGE ainda não incorporam os resultados do Censo 2010).
Por fim, os ganhos de produtividade. A sua estimação é feita por resíduo, descontando-se do crescimento efetivo do PIB a variação do estoque de capital em uso (estoque de capital ajustado pelo Nível de Utilização da Capacidade Instalada, NUCI, da economia) e a variação da população ocupada (idealmente deveriam ser consideradas as horas trabalhadas, mas esses dados são difíceis de serem obtidos para o agregado da economia brasileira). Não obstante, a produtividade é uma variável sabidamente pró-cíclica, em função da rigidez do mercado de trabalho. Com efeito, para se calcular o PIB potencial, é preciso levar em conta a tendência de crescimento da produtividade e não a sua variação em determinado ano. Embora conjunturalmente os ganhos de produtividade tenham desacelerado de uma alta de 2,6% em 2010 para apenas 0,5% em 2011, a tendência da produtividade brasileira está crescendo cerca de 1,2% ao ano.
Compondo o crescimento desses condicionantes da oferta agregada doméstica, chega-se a um crescimento potencial de 3,9% em 2011 - valor que se aproxima das outras estimativas apresentadas acima. Com efeito, um "educated guess" para o crescimento potencial da economia brasileira hoje é algo em torno de 4% ao ano.
E olhando para frente? Caso a taxa de investimento (razão entre a Formação Bruta de Capital Fixo, FBCF, e o PIB) fique em cerca de 20% entre 2012 e 2014, acima dos 19,3% de 2011, o estoque de capital deverá seguir crescendo cerca de 4,5% ao ano. Uma taxa de investimento chegando a 24% em 2014 - cenário do governo - poderia elevar esse crescimento do estoque de capital para cerca de 5,5%, agregando 0,4 ponto percentual ao crescimento potencial brasileiro). Não há razões para esperar um grande salto dos ganhos de produtividade, uma vez que eles dependem de reformas microeconômicas e de investimentos em educação que dificilmente maturam nesse prazo mais curto.
Uma grande incógnita reside no que esperar da oferta de mão de obra. As projeções atuais do IBGE apontam um crescimento médio de 1,4% da PIA em 2012-2014 - quadro não muito diferente daquele verificado na média dos últimos anos.
Não obstante, essas projeções não consideram fluxos imigratórios. Aparentemente estamos passando por uma mudança estrutural, em função do grande diferencial de crescimento e de desemprego do Brasil em relação a muitas outras economias no mundo, que vem atraindo estrangeiros para trabalhar no Brasil e gerando a repatriação de brasileiros.
Segundo o Ministério da Justiça, somente em 2011 o número de estrangeiros legalizados no Brasil se elevou em 540 mil pessoas (0,3% da PIA estimada para o Brasil em 2011). Essa é uma questão que passa a ser pertinente para avaliar a capacidade de crescimento não inflacionária da economia brasileira no futuro próximo. Um fluxo imigratório de 1 milhão de pessoas em idade ativa por ano pode aumentar nosso potencial em 0,4 ponto percentual - ou mais, caso esses trabalhadores tenham um nível médio de qualificação superior à média atual dos brasileiros, o que também elevaria os ganhos de produtividade de nossa economia.
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