terça-feira, março 20, 2012

Palpite talvez infeliz - JANIO DE FREITAS

FOLHA DE SP - 20/03/12


Nenhum partido sabe, neste momento, como se relacionar com os novos modos políticos do Planalto

DILMA ROUSSEFF vê com calma o que, no noticiário e em muitos comentários, é uma tremenda e ameaçadora crise política -eis o que se pode saber do quase mutismo presidencial sobre questões políticas, partidárias e parlamentares. A discordância das visões vem de muitos fatores, em um lado e em outro, ambos merecedores de apreciações factuais e interpretativas talvez devidas, há tempos, ao público interessado na vida nacional.

Dê-se o nome crise, como se faz com tanta facilidade no Brasil, ou veja-se a situação com naturalidade, a realidade é a mesma. Como não tenho palpitado sobre o assunto, chegou a hora de arriscar alguma coisa. Nada de especial, claro.

A meu ver, grande parte da situação advém da coincidência, nas mesas de decisão e nos plenários, de assuntos problemáticos por natureza ou porque tratados mal lá atrás. A Lei da Copa, assunto tão limitado e efêmero, por si só seria um bom exemplo de confusões, governamentais e parlamentares, que nada valem e, no entanto, produzem um barulhão. Mas, simultaneamente, há o código florestal, campo de batalha de pressões por interesse ou por convicção. E fonte de confuso mas intenso material de "crise", se os ruralistas se mostram inquietos por algum risco. Aos dois assuntos junta-se o fundo de pensão dos servidores públicos, que, assim como o código florestal, além de seus próprios nós, serve a explorações eleitoreiras.

Por quanto tempo estes assuntos ainda vão se enrolar, uns nos outros e tanto no Congresso como no governo, importa menos do que sua fatalidade: mais para lá ou mais para cá, todos vão chegar à sua saída. E pronto. Nenhum tem potencial para devastações. De um deles, o Código, podem vir sacudidelas mais fortes por parte dos ruralistas. Mas, se eles não se têm lembrado disso, o governo conta com armas fortes, sob nomes como dívidas altíssimas de ricos produtores, exigência de investimentos próprios, verificações de propriedade (ah, Deus os acuda), crimes de desmatamentos ilegais, sonegações de impostos diversos, e não só.

A par dos assuntos conturbadores, com as visões do governo e do Congresso são forçosamente diferentes, as substituições de ministros criaram ares de hostilidade entre partidos e a Presidência. Nenhum caso passou de insatisfação. Até ocorrerem as mais surpreendentes demissões, pela presidente, dos seus líderes Cândido Vaccarezza e Romero Jucá. Este, longevo integrante de uma espécie de cúpula vaticana habituada a controlar, além do PMDB e do próprio Senado, muitas decisões e políticas presidenciais nas últimas décadas.

Esses cardeais, como os mestres romanos do seu estilo, não são de rebeliões. Ardis são possíveis, e não dependem de ser ou não aliado do governo: um deles levou Dilma Rousseff a retirar de Romero Jucá a cadeira cativa. Ardis com limites, porém. Se a resposta presidencial pode ser a concessão, na qual Lula se especializou, também pode não ser. Razão que leva o estilo vaticano a preferir formas de acomodação, ainda que ambígua.

Tudo isso se move. Nem sempre de maneira compreensível à primeira vista e, para muita gente, nas seguintes também. Neste momento, a meu ver seria mais apropriado chamar de crise a situação dos partidos, tanto os governistas -PMDB à frente- como oposicionistas. Nenhum sabe, com algum grau de clareza, como relacionar-se com os novos modos políticos da Presidência. Nem, propriamente, como são tais modos.

Nós também não sabemos.

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