domingo, fevereiro 05, 2012
O Planalto criou os ''papagaios de crise'' - ELIO GASPARI
O GLOBO - 05/02/12
O comissariado do Planalto e o tucanato paulista estão namorando uma campanha sangrenta na disputa pela prefeitura. Pelo lado do PSDB, isso ficou visível quando associou uma administração petista ao surgimento do crack na cidade e com a opção preferencial pela tropa de choque que o governo do estado mobilizou para espalhar os viciados da Cracolândia e para desalojar os 6 mil invasores da fazenda Pinheirinho. Pode-se achar que essas iniciativas foram desastradas, mas estavam entre as suas atribuições. Pelo lado dos comissários, a questão parece ser outra.
A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência classificou de "absolutamente afrontante" a ação policial da Cracolândia e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, anunciou um programa federal de combate à droga, em primoroso promissório. A ideia de o governo federal funcionar como ombudsman é rudimentar. Ou Brasília tem responsabilidade na Cracolândia (e não a tem), ou consumiu nove anos para mostrar a que veio. Entrar como papagaio de crise é outra coisa.
Exatamente isso foi o que Brasília fez no caso de Pinheirinho. Podia ter entrado no caso desde 2004. Ao longo de sete anos, limitou-se a constatar que a prefeitura não estava fazendo sua parte. Falar ao público, ir a Pinheirinho, nada. Durante quatro meses o tucanato planejou (mal) a operação militar que mobilizou 1.600 soldados. Brasília tinha todos os motivos para saber que a ordem judicial seria cumprida pela Polícia Militar. Poderia ao menos tocar um sinal de alerta.
Só em janeiro, quando a panela já estava no fogo, o Ministério das Cidades apresentou uma vaga intenção de colaborar para o fim do impasse. Depois que apareceram as retroescavadeiras e a PM, o comissariado correu para o abraço, criticando o governo de São Paulo. Primeiro, o ministro Gilberto Carvalho ("praça de guerra"), depois, a própria presidente ("barbárie"), finalmente, a Secretaria de Direitos Humanos, que constituiu uma força-tarefa com a Defensoria Pública do Distrito Federal. O que faltou foi precisamente uma força-tarefa federal para evitar o episódio.
A qualquer momento a doutora Dilma ou o ministro Gilberto Carvalho e o Ministério das Cidades poderiam ter alertado a patuleia, mostrando que estavam preocupados com Pinheirinho. Se tivessem gasto assim a décima parte da energia política que consumiram denunciando o impasse, ele não se consumaria.
Quem viu a cenografia da despedida do ministro Fernando Haddad a caminho de sua candidatura a prefeito de São Paulo percebeu que aquilo era uma solenidade para vídeos eleitorais. As papagaiadas de crises também podem sê-lo.
O santo nome da Biblioteca Nacional
O PSDB tem todo o direito de protestar contra a resenha do livro "A Privataria Tucana", publicada pela Revista de História, da Sociedade Amigos da Biblioteca Nacional. Terá, também, todo direito de ir à Justiça.
O presidente da Sociedade achou que devia pedir desculpas e o fez com rapidez.
Não deveria ter retirado o texto, que estava no portal privado da revista. Poderia ter colocado dez outros, novos, rebatendo-o. A medida foi contraprodutiva, porque, não demora, e a resenha aparecerá em algum lugar da Internet.
A revista História pertence a uma sociedade de direito privado e tem a maior parte de sua circulação subsidiada pela Viúva, que a distribui em escolas. Enquanto isso, desde 2008, a Biblioteca Nacional não publica seus notáveis "Anais", que começaram a circular no Império. Na Internet, parou em 2001.
Tudo ficaria melhor se ela (ou qualquer outra instituição cultural pública) não permitisse que suas sociedades de amigos usassem o santo nome da Casa em iniciativas privadas.
Gerência
A doutora Dilma é uma grande gerente. Atendendo a ideias de computecas persuadidos por fornecedores, seu governo licitou a torrefação de até R$ 330 milhões num projeto de compra de até 900 mil tablets para escolas públicas. Desde 2009, o MEC já distribuiu 150 mil laptops para 386 escolas. Até agora, só conseguiu saber o efeito da iniciativa em 52 colégios. Ademais, não existe projeto pedagógico para acompanhar as tabuletas. É algo como comprar um carro sem saber dirigir.
Estava previsto
A radioterapia a que Lula se submete tirou-lhe 4 quilos em pouco mais de uma semana.
Chineses
Fala-se muito da ascensão da classe D aos padrões de consumo da classe C, mas o andar de cima de Pindorama atingiu os padrões de despesa dos bilionários chineses.
Um carioca resolveu passar cinco dias num bom hotel de praia no Nordeste. Pagou US$ 1.100 pela passagem e US$ 5.800 por cada noite no apartamento, sem café da manhã.
Outro, de Miami, resolveu passar cinco dias em Washington. Pagou US$ 500 pela passagem e US$ 320 por noite num hotel a um quarteirão da Casa Branca, com café.
O carioca de Miami marcou uma consulta (sem qualquer recomendação) com o renomado neurocirurgião Barth Green, entrou no hospital às sete da manhã, passou por uma ressonância magnética, fez oito chapas de raios X, foi examinado por três assistentes e teve uma consulta de 1 hora com o médico. Na saída, quitou a conta e trouxe o recibo para emoldurá-lo: pagou US$ 320, ou R$ 545.
Grande pergunta
O Supremo Tribunal discutia a prerrogativa dos magistrados serem julgados em sigilo e o ministro Luis Fux defendia o privilégio quando o ministro Carlos Ayres Britto perguntou: "Vossa Excelência acha que fica bem um cidadão ser absolvido em sigilo?".
Cônsul americano
O cônsul dos EUA no Rio, Dennis Hearne, escreveu que o signatário "fez referência a um tempo de espera de 105 dias para os que solicitam pela primeira vez agendamento para entrevista de vistos no Consulado Geral dos EUA no Rio de Janeiro. Esta informação pode confundir os brasileiros (...)".
O doutor ganha uma viagem a Pyongyang se achar onde apareceu essa referência. No dia 22 de janeiro, neste espaço, havia a seguinte afirmação: "Quando Obama esteve em Pindorama, a espera para entregar a papelada era de 134 dias em Brasília, 107 em São Paulo e 105 no Rio". Obama esteve no Brasil em março do ano passado e 105 dias era o tempo de espera para marcar a entrevista. Em agosto, a fila no Rio chegou a 120 dias. (Na semana passada a demora estava em 17 dias.)
Nos últimos cem anos, os Estados Unidos mandaram ao Brasil 23 embaixadores. Pela escala de proficiência linguística do serviço exterior americano, pode-se estimar que poucos, como o atual titular, Thomas Shannon, tenham chegado ao topo, no índice 5. Só uma meia dúzia era incapaz de entender o que lia.
(O signatário também ganhou uma viagem a Pyongyang, por ter escrito que os brasileiros gastam US$ 6 mil por dia nos EUA, quando essa cifra se referia à média das despesas dos viajantes.)
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