O aquecimento do mercado de trabalho, apesar do desaquecimento da economia desde o segundo semestre de 2011, preocupa o governo e leva alguns economistas oficiais a cogitar a possibilidade de o país vir a importar mão de obra por meio da criação de um contrato temporário de trabalho. Poderia ser, segundo eles, um contrato com prazo limitado a cinco anos, pelo menos até terminar o ciclo de grandes obras decorrentes dos eventos esportivos.
Os indicadores de oferta e demanda de trabalhadores qualificados são, de fato, inquietantes. Estima-se que de agora até 2014 as universidades do país formarão cerca de 60 mil engenheiros civis. A demanda por esses profissionais, calculada a partir dos projetos de investimentos projetados para os próximos três anos, é de 350 mil.
Na área da tecnologia da informação (TI), o quadro de escassez se repete. As escolas do país devem formar até 2014 entre 34 mil e 35 mil profissionais de TI. A demanda, conforme diagnosticada pelo governo junto ao setor privado, é de que serão necessários até lá cerca de 80 mil trabalhadores da área.
Há relatos, que chegam a esses economistas, sobre companhias que estariam contratando guardas para proteger os portões das empresas e, assim, evitar o assédio de concorrentes em busca de mão de obra especializada.
Outro indicador de que o mercado de trabalho no país continuará aquecido é a expectativa de que até 2016 as microempresas devem abrir cerca de 30 milhões de vagas.
Pesquisa feita pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) revela que 69% das empresas de construção civil apontam para dificuldades em encontrar profissionais de maior qualificação.
"Hoje o salário de um engenheiro civil no Brasil é da ordem de R$ 16 mil. Na Espanha, um engenheiro pode ser contratado pelo equivalente a R$ 9 mil", disse uma fonte do governo, que argumenta: "Temos uma transição a fazer" e uma solução possível seria aproveitar a alta do desemprego decorrente da crise na zona do euro para institucionalizar, de forma negociada com os sindicatos, o contrato temporário.
Além dos efeitos que a carência de profissionais especializados pode produzir sobre o crescimento e a inflação, a preocupação se estende também para a queda da produtividade, na medida das substituições de mão de obra qualificada por semiqualificada.
Muito se discutem as razões do aumento da oferta de emprego para níveis de quase pleno emprego ao mesmo tempo que a economia teve uma forte desaceleração. No ano passado, a taxa de desemprego foi de 4,7%, recorde de baixa.
Estudos feitos pelo Credit Suisse indicam queda expressiva da taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) necessária para manter a estabilidade do mercado de trabalho. Era de 3,3% em 2003 e baixou para a casa dos 2% em 2011. Os economistas do banco projetam crescimento de apenas 2,5% do produto em 2012 e de 4,0% em 2013 e argumentam que essa performance é compatível com a continuidade da queda do desemprego e aumento da renda.
Isso decorreu, segundo o mesmo estudo, das mudanças demográficas que o país vem atravessando, como o envelhecimento da força de trabalho e menor percentual de jovens na população economicamente ativa (PEA). O mesmo fenômeno já havia ocorrido na crise de 2008/2009. Mesmo com a contração de 0,3% do PIB em 2009, o desemprego cresceu somente 0,2 ponto percentual em relação a 2008.
O economista-chefe do banco Itaú, Ilan Goldfajn, também chamou a atenção para o que pode estar ocorrendo no mercado de trabalho, em artigo recente. A absorção de trabalhadores de menor qualificação pode estar reduzindo a produtividade média da economia, as mudanças demográficas reduziram o crescimento da PEA, ou, ainda, os empresários estariam apostando numa rápida recuperação do crescimento - tal como ocorreu na crise de 2008/2009, e evitando os custos das demissões agora para ter que voltar a contratar mais à frente. O mais provável é que seja uma combinação desse conjunto de fatores.
A preocupação de técnicos do governo com o mercado de trabalho é mais do que justificável, pelos riscos inflacionários e limitações que traz ao crescimento sustentado.
Há anos se fala da baixa escolaridade dos jovens brasileiros e das péssimas condições da educação no país. Os anos de baixo crescimento econômico mascararam o problema, adiando soluções que inevitavelmente passam pela educação. Sem demérito para os últimos governos que até tentaram melhorar a qualidade do ensino público, o fato é que as soluções não são simples, o país ficou para trás e agora colhe o preço da negligência.
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