VALOR ECONÔMICO - 14/12/11
O ex-presidente Lula transformou a reprovação do imposto do cheque (CPMF) no Senado, nos idos de 2007, no auge do seu segundo mandato sobrevivente do mensalão, em um drama político perene e indelével que gerou, desde a data do acontecido, clara obsessão: derrubar os senadores de oposição que lideraram o processo de confronto com o governo.
Lula ficou tão fissurado para derrotar aquele Senado que esse talvez seja um dos poucos pontos de total dissintonia entre seus pensamentos e ações com o eleitorado com que conta, em todas as classes sociais. Não suportar mais aumentos de impostos é sentimento espalhado, não há quem goste.
Ele não conseguiu eleger todo o novo Senado que queria, mas conseguiu muito: simplesmente a maioria. Além disso, derrotou os senadores oposicionistas Tasso Jereissati, Heráclito Fortes, Arthur Virgílio, Marco Maciel. Não derrotou todos os que botou em sua lista negra.
O senador José Agripino, do DEM, partido que, à época, tinha o combate aos abusos arrecadatórios como uma de suas principais bandeiras, sobreviveu ao jogo de extermínio.
Agora, nos derradeiros dias do primeiro ano da atual Legislatura, os partidos olham para trás e avaliam que estiveram muito divididos internamente e nenhum grupo acabou hegemônico a ponto de dominar a posição e o voto de toda uma legenda. Racharam os partidos com relação às suas direções, não necessariamente com relação ao governo. Mas uma coisa influenciou a outra.
O caso do PMDB, que preside o Senado porque tem a maior bancada, de 17 senadores, é bom exemplo. Ontem mesmo um grupo de oito senadores do PMDB que integram a facção denominada independente - independente com relação ao governo e ao grupo do partido que domina os cargos e as relações com o governo, chefiado pelo presidente do Senado, José Sarney, e pelo líder Renan Calheiros -, decidiu defender a tese da rotatividade na liderança do partido na Casa.
Esse grupo sarneysista é integrado também pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá, formando o trio de comandantes do toma-lá-dá-cá, contestado pelos independentes do partido e por todos os aliados. Nem o PT suporta mais o jogo de barganha da cúpula que, em algumas votações, deixou a base falando sozinha e foi negociar até com a oposição. A ministra chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, já buscou apoio à faxina ética fora do grupo de aliados incômodos.
Os parlamentares do PMDB reclamam de centralização de decisões por parte de Renan e de falta de discussão da bancada sobre projetos e indicações de pessoas para ocupar cargos. Como não é possível destituir Sarney, os independentes querem rodízio, pelo menos, na liderança. E se forçarem um pouco o governo mudará seu líder, Romero Jucá, já contestado pelos aliados em geral e reconhecido pela técnica de jogar cascas de banana para o próprio governo nelas escorregar.
No PP há divisão, no PSB e PDT também. As bancadas, embora fiéis ao governo, não têm se recusado a analisar cada projeto à luz do interesse do seu eleitorado.
Não foi fácil montar esse Senado. O ex-presidente Lula jogou sua popularidade nisso, foi a diversos Estados fazer palanque para os candidatos do governo e para atacar os adversários. Cumpriu a promessa à sucessora. Essa foi, também, a grande estreia em articulação política, de chapas e alianças, do ministro Alexandre Padilha, à época ministro das Relações Institucionais.
No Nordeste e no Norte, procuraram eleger governistas para as duas vagas de senadores em disputa. Conseguiram a proeza de desmontar os palanques da oposição e montar a dupla governista na maioria dos Estados, em algumas localidades disputando com três candidatos. Foi nessa empreitada que o ministro das Relações Institucionais se adensou para ocupar um ministério de peso no governo Dilma, e acabou ficando com o Ministério da Saúde.
O governo teve as facilidades que esperava do Senado que se esforçou para eleger. O que se ressalta, porém, é que não houve massacre ao contraditório neste primeiro ano. Minoritária, a oposição uniu-se aos independentes e, em alguns casos, até a integrantes de partidos governistas, para evitar que o voluntarismo resultasse em anulação do desejo do eleitorado ou impedimento à manifestação de outras correntes.
Assim, por exemplo, nesse primeiro ano de governo Dilma Rousseff, o Senado fidelíssimo, eleito por Lula, aprovou a regulamentação da emenda 29, que reprograma a aplicação de recursos orçamentários na área da Saúde, mas suprimiu dela o dispositivo que tentava recriar o imposto do cheque com o nome de CSS (contribuição social para a saúde), incluído durante a votação na Câmara.
Os senadores, em grande número governistas, reagiram também à Medida Provisória 552, editada recentemente por Dilma Rousseff, que acaba com o aproveitamento do crédito presumido do PIS e da Cofins por parte das empresas do setor alimentício. Reação puxada por Blairo Maggi (PR), Armando Monteiro (PTB), Delcídio Amaral (PT), expoentes do governismo.
Foi no Senado, também, que dois relatores absolutamente aliados do governo, do PT e do PMDB - Jorge Viana e Luiz Henrique -, mantiveram os principais dispositivos do código floresta aprovado na Câmara contra o qual o Palácio do Planalto se insurgiu.
O Senado deu a DRU (desvinculação das receitas da união) tal como o governo queria, como também aprovou integralmente outras propostas sobre as quais o governo nem fechara tanta questão. Mas esteve longe, ainda bem, de representar o papel de rebanho de carneirinhos.
Dúvida fundamental e remanescente nos arranjos do PT para a disputa eleitoral da Prefeitura de São Paulo: uma vez tudo o mais resolvido, o ex-presidente Lula conseguirá cooptar Gabriel Chalita?
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