O Copo do Mundo
DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 06/11/11
FHC, na época foi claro: precisava dizer não para aumentos de salário e de gastos. E citava esse “dizer não” como uma situação transitória para, no futuro, poder dizer sim. O PT, Lula como candidato a presidente, ficou tão boquiaberto na época quanto os tucanos ficaram na eleição de 2010, quando o petista bombava nos palanques apresentando Dilma aos brasileiros. Foi contra. Os petistas tinham a clara sensação de que, se desse certo, quem ganharia com o plano era o PSDB, como de fato ocorreu por oito anos. Se desse errado, eles queriam estar debaixo da cesta para pegar a bola e não na nau dos que tentaram fazer alguma coisa.
Guardadas as devidas proporções, se compararmos o comportamento político de muitos líderes mundiais com o passado, veremos que não temos, no plano internacional, um FHC, ou seja, alguém capaz de ousar como fizeram o então ministro da Fazenda do Brasil e o presidente Itamar Franco — que, diga-se não era candidato à reeleição nem havia essa possibilidade no Brasil. Hoje, estão todos de olho mais nos seus projetos eleitorais — a França, por exemplo, passa por eleições no ano que vem — do que propriamente na busca de uma solução ousada que tente tirar a Europa da crise.
Na Faculdade de relações internacionais do Ibmec — Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais — os professores têm sido unânimes em afirmar que o mundo está carente de grandes líderes. E os que estão com a faca e o queijo na mão também não querem abrir espaço de liderança para os emergentes. Sair do G-7, onde tudo era decidido sem ouvir mais ninguém, para o G-20 foi o máximo que eles aceitaram até agora no quesito “inclusão política”. Mas, ainda assim, resistem a aceitar receitas alheias ou palpites para suas crises. Afinal, ninguém quer perder o poder de comando na governança global.
Na passagem por Nova York, há um mês e meio, Dilma Rousseff bem que tentou se fazer ouvir no que se refere a receitas para o crise. Abriu a conferência da ONU com algumas propostas, bateu na tecla de reforma na chamada governança global, e na entrevista que concedeu, foi direta ao dizer que a receita da Europa para a Grécia não era das melhores.
Em Cannes, entretanto, a sensação foi a de que Dilma deu um freio na sua tentativa de se fazer ouvir. No fim do encontro na França, disse que o G-20 deu um passo importante em seu documento. Ela usou inclusive a teoria do copo com água pela metade, em que os otimistas veem “meio cheio” e os pessimistas “meio vazio”. Falou em “sucesso relativo” e na necessidade de detalhar as propostas — uma forma elegante de dizer que aguarda com afinco que os europeus façam o dever de casa. Afinal, no documento em que o G-20 fala de forma genérica do que deve ser feito, o grupo cita que, desde o encontro de Seul, em novembro de 2010, a recuperação global se enfraqueceu, deixando o desemprego em “níveis inaceitáveis” e falam ainda “em sinais claros de desaquecimento do crescimento nos mercados emergentes”.
Na avaliação de bastidores do governo brasileiro, a carta de intenções no documento final do G-20 é boa, mas as soluções para a crise na Europa, consideradas urgentes para evitar a contaminação de outras economias, foram adiadas. Faltou o quê? Talvez coragem. Em seu discurso de posse, a presidente Dilma, citando Guimarães Rosa, lembrou que “a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”. Talvez os líderes mundiais, com todo respeito, precisem ler Guimarães Rosa.
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