Torturas estéticas
WALCYR CARRASCO
Revista Veja - SP
Quando minha fiel escudeira, Célia, serviu o jantar, percebi que ela respirava com dificuldade.
— Você está bem? — perguntei.
— Botei uma cinta modeladora. Olha como estou magrinha.
Apertei os olhos. Na minha opinião, continuava igual. Só um pouco azul por falta de ar.
— Desista, isso só vai deixar você nervosa. Também pare de tomar remédios para emagrecer. Daqui a pouco você vai chorar sem saber por quê.
Ela concordou. Mesmo porque a cinta já estava apertando demais. Tentei ajudá-la:
— Depois dos 50 não tem mais jeito. Conforme-se.
Foi aí que ela caiu em lágrimas!
Sei o que é viver sob o jugo de uma modeladora! Quando fiz lipoaspiração, tive de usá-la por dois meses. Bem apertada. Nos primeiros dias, tive a impressão de que o coração ia sair pela boca, literalmente. Andava ereto, com o queixo empinado para a frente. Mexia os braços como se estivesse embaixo d’água. Quando ia pegar o avião, os sensores de metais gritavam. Era levado para uma salinha, onde mostrava o colete fechado por ganchos metálicos. Mesmo assim, era esquadrinhado de cima a baixo. Os agentes perguntavam, solidários:
— O senhor operou o coração?
— Não, foi para perder a barriga — respondia sem jeito.
A atitude amigável transformava-se em completo desprezo. E pior: durante o voo, minha barriga inchava. Quase morri sufocado várias vezes. O que se faz por vaidade! Uma atriz aceitou o papel de gorda da história numa novela que escrevi há algum tempo. Mal começou a gravar, iniciou o regime. Mandei um aviso:
— Seu papel é de gorda!
Ela insistiu com os amigos:
— Quero ficar bem, para estourar como estrela.
Como no íntimo rejeitava o peso, também não incorporou a personagem. Os remédios a deixaram muito nervosa. Ouvi falar de crises de choro nas gravações. O que teria sido uma gratificante estreia transformou-se num sofrimento.
Dia desses uma amiga apareceu com três manchas de queimadura no rosto.
— O que houve?
— Fiz um procedimento para eliminar marcas de expressão e rejuvenescer a pele. Como você percebeu?
Outra amiga lutou contra a celulite com a ajuda de um aparelho que emite algum tipo de raio, enquanto a esteticista dá beliscões bem fortes para queimar as gorduras.
— Doeu, mas suportei!
— Deu resultado?
— Ainda não sei, comprei um pacote de dez sessões...
Gemi por ela!
Um personal trainer que conheço é mais radical. A partir de setembro, só se alimenta de clara de ovo e batata-doce.
— É para estar com o corpo trincado no verão.
Para quem não sabe, um abdômen trincado é o mesmo que sarado, tanquinho... e não me perguntem por que essas palavras são sinônimo de beleza. Importa saber que, ao ouvir o personal trainer, entendi do que ele falava. Quer estar no auge para ir de sunga à praia. Explicou:
— Clara de ovo é proteína pura e não engorda.
Não sei se as informações procedem. Eu, pessoalmente, jamais iniciaria um regime sem base médica. Mas vale a pena viver de clara de ovo? De que me adiantaria conquistar uma barriga, digamos, “tanquinho” se entraria em crise histérica ao me lembrar de uma lasanha ao forno?
Penso muito sobre isso. Qual o motivo de sofrer tanto por meras questões estéticas? (Mesmo porque há outros tratamentos torturantes que não citei.) Terminei a conversa com minha escudeira com um conselho:
— Sabe, Célia, você não tem de emagrecer. Precisa é de um amor.
— Será?
Fiz que sim. Todo mundo diz que quer ficar bonito. Mas o que falta é amor. Simplesmente, um novo ou antigo, mas um maravilhoso amor.
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