Contágio
CELSO MING
O Estado de S. Paulo - 12/07/2011
As autoridades da área do euro estão praticando, por tempo demasiadamente longo, uma política de beira de precipício, imaginando que as urgências do mercado financeiro serão inevitavelmente subjugadas pela lenta e inconsequente agenda política. Mas os fatos dizem o contrário.
Esta segunda-feira foi mais um dia de turbulências. Seria apenas mais um episódio de quase pânico, se desta vez as pressões não tivessem rompido o dique que as autoridades vinham construindo ao redor dos países da periferia do euro: Grécia, Portugal e Irlanda. Mais duas economias, Itália e Espanha, estão agora ameaçadas de contágio (veja mais no Confira). E, no entanto, a economia da Itália é três vezes o tamanho das economias da Grécia, Irlanda e Portugal juntas. E a da Espanha, duas vezes.
Nesta segunda, para comprar defesa (Credit Default Swap) contra derretimento da dívida da Itália, o prêmio de risco do país chegou ao recorde de 266 pontos-base (ou 2,7% ao ano acima do rendimento de um bônus da Alemanha); e o da Espanha, superou os 330 pontos-base (ou 3,3% mais rentáveis anualmente que um bônus alemão), nível mais alto desde a criação da moeda europeia. Isso significa que a percepção de perigo de calote aumentou substancialmente na área do euro. E, em consequência disso, as bolsas e todas as demais aplicações de risco despencaram.
O problema mais urgente a resolver consiste em definir quem, afinal, vai pagar a conta da festa regada a farta dívida pública. Até agora, as autoridades da Alemanha e da França tentavam empurrar um pedaço do problema para os credores (bancos). O Banco Central Europeu condenou a proposta. Sabe que, além de não garantir socorro definitivo para os estados soberanos a perigo, produziria uma corrida aos bancos e, logo em seguida, a quebra dos mais expostos a dívidas soberanas sujeitas à suspensão de pagamentos. Ou seja, nesse estágio de deterioração, o setor público teria de lidar com rombos patrimoniais dos bancos.
Mas uma solução de curto prazo não equacionaria o problema de fundo, o da grave deficiência de fundamentos do euro. Uma moeda comum só pode dar certo em países de economia e sistemas tributários tão diferentes se houver controle dos orçamentos – o que pressupõe um mínimo de unificação fiscal e de unidade política, até agora, inexequíveis.
Os líderes do Projeto Europeu sabiam disso quando criaram o euro. Mas pressupuseram que a primeira grande crise que viesse provocada por deficiência de DNA da moeda provocaria um tranco suficientemente forte para desembocar nas necessárias condições de construção da nova unidade fiscal e política. A forte crise está aí, já dura dois anos e, porém, por questões políticas menores, as autoridades seguem empurrando as soluções com a barriga. E é esse posicionamento de sucessivas compras de tempo que acabou por criar essa política de beira de precipício.
Nesta segunda-feira, as principais autoridades da área do euro foram convocadas a Bruxelas pelo presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy (foto), para uma reunião de emergência. Desse compromisso, não saiu nem um comunicado oficial. Para hoje está agendado um novo encontro, desta vez dos ministros de Finanças do bloco. Reuniões e mais reuniões se sucedem sem que se obtenha progresso claro.
Isso sugere que o abalo nos mercados terá de ser ainda mais forte para que, enfim, apareça uma solução.
Consequência do quê? Nesta segunda, a cotação do dólar no câmbio interno subiu 1,09%, fechando em R$ 1,59. Porém fica difícil saber até que ponto esse avanço é uma consequência das decisões tomadas pelo Banco Central na noite de sexta-feira – que restringiram a operação dos bancos no mercado de derivativos. Um pedaço dessa evolução de desta segunda-feira deve ter acontecido como uma reação à crise externa.
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